Cultura

Ritmos, Emoções e Encontros: MEO Marés Vivas 2025

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Do jazz de Jéssica Pina ao rock dos Scorpions, passando pela energia contagiante dos Xutos e a intimidade de Tiago Nacarato em Família e Milhanas — o MEO Marés Vivas 2025 revelou-se como uma celebração vibrante da música em todas as suas formas.

O sol ainda estava alto quando cheguei ao recinto, cedo o suficiente para apanhar Jéssica Pina a abrir o Palco Moche. Trompete em punho, presença serena mas confiante e um público que se foi aproximando, atraído pelo som e energia quentes da artista. A sua experiência musical, que já a levou a partilhar palcos com artistas como Madonna, na digressão MADAME X, fazia-se notar em cada nota, pelo à vontade em palco e interação natural com o público. Ainda assim, havia algo de íntimo, como se estivéssemos todos a partilhar um segredo ao início da tarde, num compasso tranquilo.

Jéssica Pina | Fotografia: Inês Aleixo (@0xiela)

O trompete deu lugar às guitarras, chamando-nos para o Palco MEO. Hybrid Theory, banda de tributo a Linkin Park formada em Lagos, trouxe um choque de energia que incendiou o recinto. Conhecidos pela forma como recriam a experiência dos concertos da banda original, foram verdadeiros mestres em elevar a energia do público: braços no ar e refrões gritados em uníssono.

Tiago Nacarato em Família marcou o meu dia com um abraço sonoro. Cantor e compositor portuense com raízes brasileiras, Nacarato trouxe ao palco um espetáculo íntimo e familiar, com vários membros da sua “família musical” a entrarem e a saírem, vozes femininas e masculinas a dialogarem, e uma homenagem emocionada ao pai, a sua inspiração maior. Foi um momento de cumplicidade profunda, uma festa de sons e afetos que fez o público esquecer o cansaço e celebrar a música como se estivéssemos em casa. A presença no palco quase ao nível do chão, o ambiente familiar e o convite à proximidade fizeram deste concerto um dos momentos mais genuínos do dia.

O blues e soul de Marcus King chegaram como um copo de água fresca num dia de calor. Filho e neto de músicos, King já acumula uma discografia respeitada e atuações aclamadas pela crítica, que misturam influências do blues tradicional com rock e psicodelia. Por um instante, o Porto tinha trocado a brisa atlântica pelo ar quente do sul dos Estados Unidos.

Marcus King é, indubitavelmente, um músico talentoso, com habilidades na guitarra e vocais invejáveis. No entanto, para mim, as músicas começaram a soar um pouco repetitivas, e, sendo blues, senti falta daquela energia mais intensa que o género costuma transmitir. Em retrospetiva, foi uma pena ver o palco principal ser ocupado desta maneira, enquanto Milhanas — uma jovem promessa da música portuguesa, com raízes no fado e no pop, que tem vindo a conquistar prémios e reconhecimento nacionais — foi colocada num palco secundário, com um curto concerto de apenas 45 minutos. Talvez esta comparação pareça ao/à leitor/a injusta, mas senti que a sua presença merecia mais tempo e espaço para brilhar, inclusive em detrimento do artista norte-americano.

Marcus King | Fotografia: Inês Aleixo (@0xiela)

No entanto, a energia que me faltava chegou ao entardecer, trazendo consigo a multidão maior do dia. Era impossível não perceber que Xutos & Pontapés estavam prestes a entrar, fosse pelas t-shirts que pintavam o público, fosse pelo mar de gente que se juntava. Com uma carreira de quase 50 anos e considerados uma instituição do rock português, trouxeram para o palco principal uma explosão de energia e emoção. “A minha casinha” ecoou como sempre, com o recinto inteiro a cantar mais alto que a própria banda. Havia miúdos aos ombros dos pais, casais de mão dada, grupos de amigos com cerveja na mão — todos a viver o mesmo refrão como se fosse a primeira vez. Os Xutos são sempre casa, e nunca falham em criar um ambiente de celebração e comunhão.

Depois da catarse coletiva, um recuo para algo mais íntimo. Milhanas subiu ao Palco Moche com a sua voz doce mas firme, trazendo um momento de pausa e contemplação.

Milhanas | Fotografia: Inês Aleixo (@0xiela)

A pausa foi breve, porque os Scorpions não dão espaço para descanso. A lendária banda alemã, com seis décadas de carreira e clássicos eternos como “Rock You Like a Hurricane” e “Wind of Change”, trouxe um espetáculo de rock puro e paixão contagiante. Apesar do vocalista mostrar sinais de desgaste físico, foi impossível não respeitar a entrega e o amor que a banda tem pelo palco e pelo público. Milhares de baquetas, palhetas e toalhas voaram para a plateia. O público cantou em uníssono, numa comunhão intergeracional que mostrou a força intemporal do rock e o legado indubitável desta banda, que celebra este ano 60 anos de história.

Scorpions | Fotografia: Inês Aleixo (@0xiela)

O festival, claro, foi muito mais do que o meu roteiro pessoal. Entre outros, passaram pelos palcos nomes como Insertcoin, bem como vários comediantes no Palco Comédia, tais como Newcomers, Rúben Branco e Eduardo Madeira, cada um a acrescentar a sua cor e o seu som a este arranque.

Primeiro dia feito, e já a promessa de que o resto do festival será tudo menos morno. Porque, no fundo, o melhor de um festival é isto: viver tantas histórias diferentes no mesmo espaço, e sair com a sensação de que vimos um bocadinho de cada mundo.

Fotografia de Destaque: Hybrid Theory por Inês Aleixo (@0xiela)

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