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Artigo de Opinião

NOTA DE UM SUICÍDIO

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João Paulo

João Paulo

Sempre que se tem conhecimento de alguém que pereceu por suicídio, o comentário que muito se ouve, nomeadamente proferido pelos menos informados, é “um cobarde!”.

Mas já alguém parou para pensar na coragem que é precisa para pôr termo à própria vida?

Contudo, o que me traz a estas páginas não é a coragem ou a cobardia do julgamento alheio, mas sim os porquês.

Pode alguém imaginar um jovem ser humano pôr termo à vida, porque partiu aquele jarrão que a mãe comprou na festa do Senhor de Matosinhos? Claro que não, os comentários de “maluco”, “trengo” ou do “parece parvo” serão mais que muitos, mas para o jovem quebrar aquele jarro, logo aquele que a mãe tinha elevada estima, é o mundo. Ele sabe que custou cinco euros mas também sabe que a mãe antes de comprar pensou e pensou e os seus olhos brilharam quando decidiu finalmente comprar. E já lá em casa qualquer movimento brusco exaltava aquele grito aflito “cuidado com jarro, nem sei que te faço”. O desgosto de tirar à sua mãe aquele bem emocionalmente valioso é devastador e, por isso, é melhor morrer que ver a sua mãe triste e/ou desesperada por perder algo que afinal até existe um milhão e, por sinal, até só custa cinco euros.

Mas, se este é um caso menor aos olhos dos que de fora observam a desgraça alheia, outro há que nos fazem pensar, ou não. Os romances estão pejados de mortes por amor, algumas dessas mortes tornaram-se clássicos, bases de estudo e remakes em filmes e peças de teatro, tal é a beleza, não do suicídio, mas da razão do mesmo. O herói e/ou a heroína da história mata-se por amor.

Contudo, hoje em dia, e haverá quem mais tarde venha a contar todas as histórias, as pessoas matam-se direta e ou indiretamente por dívidas de toda espécie, desde aquelas que não se consegue honrar, porque se perdeu todo o sustento que se tinha, às outras que tem origem nos vícios vários da vida. Mas temos ainda o suicídio com origem na privação da medicação que nos mantem acordados neste mundo de incompreendidos de enfermos intelectuais.

As razões que nos podem levar a num ato de desespero, porque é disso que se trata, de um ato de desespero, a pôr termo à nossa vida são aos olhos dos demais coisas fúteis, ou não. Diz o povo que “mostarda no cu dos outros a mim não arde” ou se preferirem “só quem vive no convento sabe o que lá vai dentro”. Por outras palavras, a dor que cada um sente é sua e só essa pessoa sabe quantificar essa mesma dor e ninguém mais.

Muitos foram os génios que, ao sentirem-se desajustados numa sociedade que lhes surgia insatisfatória, puseram termo à vida. Esses mesmos génios, hoje intitulados de superdotados, continuam, mesmo que em menor escala, a desistir. Um estudo sobre o suicídio entre jovens homossexuais concluiu que os suicidas punham termo à sua vida não pela sua condição sexual, mas por não suportarem a pressão social sobre essa mesma condição. Dizia a nota de um jovem “Desculpem pai e mãe, mas não aguentei mais os meninos da escola e os olhares dos vizinhos”.

Assim, termino dizendo que de alguma forma somos todos cúmplices deste desatino, pela falta de atenção que temos sobre aqueles que nos cercam.

Julguem menos e deem mais abraços, mais bons dias, mais olás.

 

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