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Artigo de Opinião

THE KIM DAVIS AFFAIR

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João Luís Tavares

João Luís Tavares

Quem me conhece sabe que sou católico praticante. Vou à missa todos os domingos, faço voluntariado, dou catequese, canto em vários coros e sempre que é preciso alguém para ajudar é certo que me vou oferecer. Mas como qualquer cristão minimamente inteligente não sigo tudo o que vem na Bíblia à risca, até porque gosto muito de marisco e sacrificar cordeiros não é bem a minha onda (Também nunca experimentei…). Portanto, eu como bom cristão, fiquei radiante quando em Junho deste ano, o Supremo Tribunal dos Estados Unidos finalmente decretou o fim da discriminação que era, legalmente falando, inconstitucional contra os casamentos gay.

Vamos esclarecer aqui várias coisas, o chamado ‘casamento gay’ não vai de maneira nenhuma contra as minhas crenças, e mesmo que fosse isso era absolutamente irrelevante! Existe separação entre a Igreja e o Estado, algo que era absolutamente impensável não ocorrer nos dias de hoje, e o casamento não passa de um contrato assinado entre duas pessoas dotadas de personalidade e capacidade jurídica (legalmente falando). Portanto, porque raio haveríamos de discriminar contra duas pessoas que, voluntariamente, decidem formar uma parceria aos olhos da lei simplesmente porque têm uma orientação sexual que é considerada ‘divergente’? Ninguém está a pedir que a Igreja case pessoas do mesmo sexo. Nunca se pôs sequer esse argumento em cima da mesa, mas o Estado tem essa obrigação constitucional porque, aos olhos da lei, somos todos iguais…

Portanto, vão compreender quando vos digo que para além de surpreso fiquei extremamente furioso quando li a notícia que uma funcionária do registo civil no estado do Kentucky se recusa a emitir certidões de casamento a casais do mesmo sexo porque acha que isso quebra a Lei da Liberdade Religiosa e porque vai contra os princípios da sua fé. E é aqui que a porca torce o rabo, porque a fé dela é a minha fé, e é a mesma fé professada por mil milhões de pessoas ao redor do mundo, e ela está a denegrir a imagem de nós todos. E de todas as falácias existentes, as generalizações apressadas são porventura as que mais me preenchem a cabeça… Com base nesta notícia que vão pensar as pessoas dos católicos? Que são todos uma cambada de retrógados, o que não é verdade. Que autoridade tem aquela senhora para falar da ‘santidade’ do casamento quando ela própria já vai no seu quarto? Também nega direitos constitucionais, de algo que nada tem a ver com a Igreja, aos casais recém-casados? Nega o direito ao divórcio a todos? E a quem usa roupa feita de tecidos misturados? Bem me parecia… No mesmo livro (capítulo 18, um capítulo só sobre sexo [a palavra nudez, só neste capítulo, é referida vinte e três vezes], provando que as únicas pessoas que são obcecadas com sexo são mesmo os ninfomaníacos e os púdicos…) que as pessoas gostam de atirar para ‘justificar’ a invalidade do casamento por pessoas do mesmo sexo, as pessoas casualmente ignoram o resto do livro, em que se refere, entre outras coisas, que é proibido comer gorduras (capítulo 3, versículo 17), rasgar as roupas (capítulo 10, versículo 6), comer marisco (capítulo 11, versículos 10 a 12), ir à igreja menos de 33 dias depois de se dar à luz um rapaz, ou 66 dias se for uma rapariga (capítulo 12, versículos 4 e 5, respetivamente), misturar tecidos nas vestes (capítulo 19, versículo 19), aparar a barba (capítulo 19, versículo 27), entre outras regras igualmente fantásticas… Façamos o seguinte, então… Se querem usar a bíblia como base para um discurso de discriminação, tentem seguir à risca todas as regras que vêm lá bem explícitas…

“A Deus o que é de Deus, a César o que é de César” (Evangelho de Mateus, capítulo 22, versículo 21). Acho que esta frase explicita bem o que falta aos católicos que gostam de usar da sua religião para suprimir, ou pelo menos tentar suprimir, os direitos civis dos outros apesar destes direitos, novamente, não terem nada a ver com religião. Se eu estiver de dieta não vou exigir a toda a gente que pare de comer donuts. Como católico inteligente que sou, crítico de tudo o que lhe põe à frente (a Igreja não está, claramente, isenta deste escrutínio) gosto de pensar que aos olhos de Deus somos todos iguais e que Deus, com o ser perfeito que é, não comete erros. E se a obra de Deus é perfeita, porque haveríamos nós, seres imperfeitos, de a criticar? Termino com mais uma citação bíblica, porque acho que não poderia terminar numa nota melhor. Evangelho de João, capítulo 15, versículo 12: “E o meu mandamento é este: que vos ameis uns aos outros, assim como Eu vos amei.”.

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