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Artigo de Opinião

O ADÃO E O IVO

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Sandra Figueiredo

Sandra Figueiredo

Chumbar a coadoção homossexual é negar às crianças o direito de usufruir da proteção legal dos dois progenitores, em vez de apenas um, o parente biológico. Se o pai ou a mãe biológica da criança falecer, o seu companheiro não terá quaisquer direitos legais sobre o filho – apesar já se terem criado laços parentais entre si. Portanto, quando se menciona que este projeto é um atentado impúdico às crianças, espelha-se apenas um pedido obscuro de sacrificar o bem-estar das crianças em nome do politicamente categórico.

O chumbo da coadoção é de facto, uma vitória para muitos. O vencer do conformismo, da tradição e da palavra de Deus – porque Deus criou a “Adão e a Eva”, não o “Adão e o Ivo”. Sim, Deus que supostamente defende a igualdade entre todos os seres humanos, para que o amor fosse o valor central da nossa vivência terrena.

Seriam então os deputados do PPD-PSD e CDS/PP que iriam proibir a coadoção por casais homossexuais como se, depois deste chumbo deixassem de haver famílias com dois pais ou duas mães. Como se o poder do parlamento excedesse a realidade social e separasse gerações e a coexistência familiar das crianças.

As pessoas gostam de pensar assim, e por isso celebraram fervorosamente quando a notícia saiu nos meios de comunicação social. Certamente que até ao momento ainda não se tinham apercebido que estas famílias já existem – como se estas crianças fossem manifestamente diferentes das outras e fosse observável ao olho nu que os seus pais partilham o mesmo género.

As pessoas estão perfeitamente imóveis no tempo, e não querem alterar o decurso normal da sua vida. Querem o seu conforto, especialmente polvilhado pela inércia e inaptidão. Talvez isso se relacione com a configuração natural humana para a economia de energia – tentar viver do mesmo, criar padrões de existência e parâmetros de inalterabilidade. O status quo determina, portanto, que as crianças precisam de um pai e de uma mãe para serem felizes e bem-educados, porque sempre assim o foi. Desta máxima inquestionável exclui-se logicamente os pais divorciados, viúvos, e até os filhos órfãos.

Mas estes filhos que já existem e já possuem duas mães ou dois pais, que lhe dão apoio financeiro, carinho e proteção, não vão deixar de existir. Num ímpeto defeituoso Portugal, distanciando-se da lei internacional – que proíbe a discriminação com base na orientação sexual e na identidade de género – conseguiu afirmar-se como um país que teoricamente democrático, se impõe nas decisões pessoais dos indivíduos.

Teremos nós legitimidade para dar palpites acerca de famílias que já existem, e que o parlamento se recusa a reconhecer perante a lei? Neste ponto, pode-se afirmar que a homofobia e respetiva descriminação está tão perpetuada na nossa sociedade que já deixou de atingir apenas os homossexuais – agora também abrange as suas crianças que, ao que parece, não merecem os mesmos direitos que as outras.

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