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Cultura

A estética ‘twink’ e os novos paradigmas da masculinidade no mundo das artes

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Desde o passado Festival de Cinema de Veneza que, nas redes sociais, se reavivou a discussão sobre os ‘twinks’ e o quão inclusivo e novo realmente este padrão de beleza masculino é.

O que é ‘Twink’?

A terminologia provém do jargão LGBTQI+ anglo-saxão e usa-se para referir homens gays jovens de entre 15 a 25 anos, magros e brancos. As origens do termo não são conhecidas, mas as explicações mais usadas nas redes sociais são aquelas que se referem a um bolinho recheado de creme, o Twinkie.  Já outras definições apontam a uma possível evolução de ‘twank’ uma gíria inglesa usada para homens que exercem a prostituição num contexto homoerótico.

Com o tempo, ‘twink’ popularizou-se na cultura pop com a ajuda de artistas que possuíam estas características físicas como Timothée Chalamet, Tom Holland, Troye Sivan, Jaden Smith, e muitos outros. Tal foi o impacto desta nova preferência estética que, em 2018, um artigo escrito por Nick Haramis e publicado no New York Times dava-nos as boas-vindas à “era dos twinks”.

O texto em questão causou grande polêmica e não demorou muito tempo para que muitas pessoas o criticassem, mencionando que dita moda não era assim tão nova, e muitos outros até consideravam a denominação ofensiva e racista, pois, tradicionalmente, era apenas usada para falar de jovens brancos.

Novos rótulos, velhas ideias

Ao ritmo com que as consciências sobre o feminino se vão modificando, o conceito de masculino na nossa cultura também passa por um processo de restruturação.

A sociedade atual está à procura de uma nova representação da masculinidade, do que significa ser homem, desde a sua aparência até a forma como se deve comportar socialmente.

Assim, no mundo das artes e do espetáculo, essa tendência reflete-se nestes novos artistas que, fisicamente, são vendidos pela indústria como um contraponto ao clássico herói ou anti-herói hipermusculado e de atitudes groseiras e carácter duvidoso.

A delicadeza e a sensibilidade e, muitas vezes, a inocência destas novas propostas de protagonistas masculinos parecem marcar o começo de uma nova masculinidade mais consciente e conectada com as suas emoções. Porém, o êxito dos ‘twinks’ parece apenas superficial, sendo que o seu foco principal é o aspeto físico e a juventude idealizadas.

A través da beleza destes jovens a indústria transforma-os em objetos de desejo, algo que as mulheres jovens sabem muito bem, isto evidencia-se dentro e fora das indústrias cinematográficas e musicais há muito tempo.

Lembremo-nos de um jovem Leonardo DiCaprio em “Titanic”, ou até mesmo Zac Efron em “High School Musical”, entre muitos outros jovens artistas, que ao perderem naturalmente estas características próprias da juventude passaram por uma mudança de imagem e a suas carreiras levaram-nos a outros tipos de papéis e rótulos dentro e fora do cinema. Algo, por outro lado, bastante diferente do que normalmente acontece com as mulheres, que a partir dos 40 anos vêm os seus trabalhos na sua profissão a diminuem progressivamente.

Troye Sivan e Charli XCX. Single ‘1999’

Esta obsessão pelos torsos masculinos magros, jovens e lisos de Hollywood, não é mais que a renovação subtil de uma estética juvenil anterior e seria demsaiado otimista acreditar que se trata de uma quebra de paradigmas sociais e culturais. Além disso, a ligação da figura dos ‘twinks’ está relacionada a comunidade LGBTQI+, algo que muitas vezes pode ser entendido como uma forma de tentar delimitar as relações homossexuais através de uma visão hétero-patriarcal que controla a imagem e o comportamento dos jovens gays, ditando o que é certo e o que é errado num relacionamento homoafetivo, como a romantização de relacionamentos entre homens jovens ou adolescentes e um adulto, muito mais velho e experiente.

No que toca à aparência, o jovem ‘twink’ opõe-se a homens de aspeto mais robusto e tradicionalmente considerados másculos, configurando uma dicotomia rudeza/fragilidade similar à encontrada nas dinâmicas sociais do masculino e feminino, levando essa dialética no seu aspeto estético até mundo das artes.

Na Antiga Grécia…

Era frequente que homens mais velhos de classe alta tomassem baixo sua proteção a homens mais jovens que estavam na idade de iniciar o serviço militar. Estes rapazes eram conhecidos como os efebos.

Na Grécia Clássica as relações homossexuais estavam bem vistas na sociedade, sempre que se restringissem a certas normas. Desta forma estabelecia-se uma hierarquia entre os amantes em que um era o mais velho, o mentor, e o outro era o mais jovem, o pupilo.

Neste contexto, salvaguardava-se o posto de superioridade do homem adulto, enquanto que ao jovem era concedida uma posição de submissão, entendida, normalmente, quase como uma espécie de substituição do lugar da mulher. Consequentemente, regularizava-se o olhar patriarcal nas relações físicas e emocionais entre dois homens.

Podemos estabelecer um paralelo entre as formas aceites das práticas homossexuais na Grécia Antiga e as consideradas aceitáveis na “era twink”. Portanto, mesmo que o tempo nos transporte até ao futuro, o caminho traçado pela nossa cultura e sociedade parecem, às vezes, uma viagem incessante ao passado, da qual deveríamos mantermo-nos alerta para não continuarmos a repetir velhas narrativas através de novas vozes.

Artigo da autoria de Aida Zimmer 

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