Connect with us

Cultura

The Last Dinner Party lançam o seu primeiro álbum Prelude to Ecstasy

Published

on

“Queríamos que o nosso primeiro álbum fosse uma declaração de missão.” Prelude to Ecstasy, lançado a 2 de fevereiro de 2024, é a primeira grande obra de The Last Dinner Party. 


The Last Dinner Party é uma banda britânica formada em 2021, composta por cinco membros: Abigail Morris (vocalista), Lizzie Mayland (vocais, guitarra), Emily Roberts (guitarra principal, bandolim, flauta), Georgia Davies (baixo) e Aurora Nishevci (teclado, vocais), acompanhadas ao vivo por Rebekah Rayner (bateria). 

Apesar dos contratempos que a pandemia lhes trouxe, a banda já arrecadou vários prémios desde o seu primeiro single “Nothing Matters”, nomeadamente o Rising Star Brit Award, a adicionar a todo o sucesso nas redes sociais. Com o lançamento do seu disco, The Last Dinner Party vêm confirmar e até superar as expectativas de serem “rising stars”, tendo inclusive sido alvo de polémica por o seu primeiro álbum ser “demasiado bom para ser verdade”.


Tendo como referência musical o grande David Bowie, The Last Dinner Party já foram comparadas com Kate Bush, ABBA, Queen e Florence and the Machine, esta última inclusive partilha do mesmo produtor, James Ford. O boom que estas artistas estão a causar é justificável pelo modo sofisticado com que apresentam a sua sonoridade no seu álbum debut, num estilo que foi descrito como art-rock pela Rolling Stone UK. Adicionando a toda a vertente rock mais barroca, vem um visual coletivo que chama à atenção: vestidos e corpetes saídos dos filmes de época. Sendo assim, a banda apresenta-nos sons familiares mas, simultaneamente, refrescantes.

Ao longo do álbum, o ouvinte é apanhado de surpresa pelo dinamismo e versatilidade sonora, desde música clássica a rock, sem nunca sentir que perdeu o fio à meada. Há um cuidado imenso em manter uma narrativa coesa, numa viagem musical que nos conta várias histórias, explorando temas como a identidade de género, o sexismo e o amor com uma convicção avassaladora

Imagem: The Luna Colective.

Prelude To Ecstasy” explora a música clássica orquestral, surpreendente por si só, mas principalmente por ser a primeira faixa de um álbum de uma banda indie rock. Uma escolha ousada para capturar o interesse de quem ouve pela primeira vez.


Burn Alive” começa com uma batida forte e uma melodia sombria. Com letras como

“There is candle wax melting in my veins/ So I keep myself standing in your flames/ Burn, burn me alive”

, a música trata de uma dinâmica tóxica, em que, para a narradora, ficar parece a única forma de continuar a viver.


Caesar on a TV Screen” aborda o tema do sexismo de uma maneira subtil –

“When I put on that suit/ I don’t have to stay mute/ I can talk all the time/ ‘Cause my shoulders are wide.!

Simultaneamente, as referências a Júlio César e a Leningrado (atual São Petersburgo), remetem para um momento de grandeza curto, limitado no tempo.


Os versos de “The Feminine Urge” são alusivos ao papel das mulheres numa sociedade patriarcal, bem como a necessidade feminina de cuidar de forma terna, ao instinto materno. Musicalmente, é uma canção com melodia e cadência contagiantes.


On Your Side” refere-se à dinâmica de uma relação que terminou, à necessidade de manter a pessoa por perto e de a apoiar em momentos difíceis. A transição entre estas duas últimas músicas revela a capacidade narrativa da banda: ambas se relacionam com a dimensão de “cuidar”, de sarar as feridas emocionais daqueles que amamos.


Beautiful Boy” surge como mais uma referência à identidade de gênero e à dicotomia social homem/mulher, evidenciando uma certa inveja pelo sexo oposto –

“The power in my hips is useless in the dark/ What good are red lips when you’re faced with something sharp?”

São referidas a sexualidade e beleza feminina, algo que a sociedade tende a assumir como os privilégios da mulher, mas que poder têm efetivamente estes fatores quando são confrontados com adversidades, numa sociedade controlada por homens?


Gjuha”, com cânticos e harmonias vagamente religiosas, juntamente com melodias em órgão, é uma contribuição de Aurora Nishevci: “Nós tínhamos falado sobre ela cantar uma música em albanês para o álbum. Ela afastou-se e voltou com esta peça linda e comovente. É sobre ela sentir a dor e culpa de vir de um país e de uma família que falam albanês e são de Kosovo, mas ser criada em Londres e não falar essa língua.”, contou Abigail Morris à Apple Music. Para além de ser uma expressão das limitações da linguagem, é um interlúdio incrível, inserido numa transição perfeita com a contagiante “Sinner”. “Sinner” é uma chávena de espresso depois de uma noite mal dormida, com o seu ritmo e camadas musicais que ficam na cabeça e se sentem no corpo. “É uma história de auto aceitação e do desejo de que o eu do passado e do presente se tornem um só”, partilha a guitarrista Lizzie Mayland.


A boa disposição mantém-se em “My Lady of Mercy”, com os seus riffs de guitarra elétrica e a exploração da temática do amor e do desejo. Já “Portrait of a Dead Girl” traz o assunto de relações abusivas novamente à tona, com letras poderosas como

 “And I wish you had given me the courtesy/ Of ripping out my throat/ And I wish that I’d let you have the dignity/ Of letting me go”. 

Uma canção impactante nas suas repetições e crescendos.


Nothing Matters”, o primeiro single da banda, é o diamante do álbum, tanto por toda a atenção mediática que lhes tem proporcionado, mas principalmente pela batida e vocais infecciosos, que nos lembram os ABBA, por exemplo.


Mirror”, a última faixa do álbum, surge como mais uma referência à autorreflexão, com uma voz de veludo, demonstrando vulnerabilidade, expressando a necessidade de validação externa, simbolizada pela metáfora recorrente do espelho. As alusões ao oceano em 

“What if I keep sinking?/ If I drown will they make me a star?/ When you drown/ Do they know who you are?”

 transmitem um sentido de contemplação da natureza transitória do sucesso e da fama. O álbum acaba como começa, com recurso à música clássica, tornando esta faixa num espelho no sentido literal também.


Apesar da longevidade do sucesso de The Last Dinner Party ser incerta, o impacto do seu Prelude to Ecstasy é inegável, alcançando o primeiro lugar no Top de álbuns no Reino Unido e na Escócia. Este disco cumpre, de facto, a missão de apresentar a banda ao mundo, marcando assumidamente uma posição no que diz respeito a tópicos controversos como a identidade de género e o feminismo, numa sociedade cada vez mais polarizada, de uma forma inteligente e completamente cativante. Musicalmente, é um álbum que surpreende a cada faixa e deixa quem ouve a chorar por mais, surgindo como um relâmpago de energia no panorama musical atual. O expectável é que seja de facto um prelúdio para a êxtase que será a carreira do grupo.

O público português terá a oportunidade de assistir à ousadia e maturidade sonora de The Last Dinner Party ao vivo, no festival Primavera Sound 2024, no dia 6 de junho, no Parque da Cidade do Porto.

Por Sara Margarida Figueiredo Oliveira da Silva