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Artigo de Opinião

SÓ EU SEI

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É já incontornável. A petição que visa despenalizar a morte assistida vai mesmo ser discutida na Assembleia da República depois de, em apenas dois dias, ter reunido as 4 mil assinaturas necessárias para o efeito.

A morte assistida (quando o fármaco letal é administrado pelo médico) ou o suicídio assistido (quando é o próprio doente a administrar o fármaco letal) são atos realizados a pedido do doente, informado e consciente, num estado de doença avançada, sem qualquer hipótese de cura, antecipando ou abreviando a morte.

Este é claramente um tema que, pela sua sensibilidade, deve merecer um amplo debate não só a nível parlamentar, mas a nível de toda a sociedade civil. Este deve ser um debate onde se debata não a nível metafisico, mas a nível humano. E é aqui que se deve centrar o debate, na humanidade. Na humanidade dos cuidados de saúde e na humanidade das convicções individuais.

Relativamente aos cuidados de saúde, nomeadamente aos cuidados paliativos, é sabido o quão mal funcionam. Muitos doentes são sinalizados para cuidados paliativos já numa situação muito debilitada, não permitindo que os mesmos tenham a eficácia e a capacidade de tratar os doentes de forma holística. Esta deve ser a primeira resposta a dar pelo nosso sistema de saúde. Maximizar as capacidades dos cuidados paliativos, permitindo a todas as áreas de intervenção médica uma maior capacidade de articulação com os cuidados paliativos e com todos os profissionais de saúde, minimizando ao máximo o impacto da doença na fase terminal e preparando o doente para a etapa final da vida. Só depois de potenciados os cuidados paliativos é que podemos, consciente e abertamente, falar na despenalização da morte assistida.

Como vemos a vida? Como vemos a morte? O que significa para mim estar vivo? O que considero uma vida digna? Como vejo o sofrimento? Como me sinto em passar por um processo doloroso e incurável, sabendo de antemão o meu fim? Ninguém pode responder a estas questões por ninguém. Cabe a cada um decidir, neste caso específico, o caminho a seguir. Chama-se a isto liberdade individual. E ninguém deve ter o direito de colocar em causa a liberdade individual de cada um. Porque é que alguém deve decidir por mim?

Parece-me falacioso argumentar que, constitucionalmente, a despenalização está, à partida, ferida de morte, já que a Constituição da República prevê o direito à vida. Isso coloca, desde logo, em causa a existência do aborto, mesmo sabendo que os nascituros não têm proteção jurídica.

Deve ser claro a todos que, centrando o debate na humanidade individual a que todos temos direito, o mesmo se deve focar em casos em que a medicina não consegue responder ou minimizar o processo doloroso e final da doença. Devem ser prevenidas à partida todas as possíveis formas de abuso desta possível lei.

Será humano sofrer até morrer? Só cada um pode responder por si. E é por isso que penso que a aprovação constituiria um avanço importante no que às liberdades individuais diz respeito.