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Artigo de Opinião

EMIGRAÇÃO PORTUGUESA CONTEMPORÂNEA (II)

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João Queirós

João Queirós

No meu último artigo tive oportunidade de enumerar algumas ideias que vale a pena evidenciar sempre que queremos falar dos importantes movimentos emigratórios que recentemente vêm caracterizando as estratégias de mobilidade geográfica e social de vastos segmentos da população portuguesa. Nessa altura, pude avançar que, sendo importante sublinhar que Portugal nunca deixou realmente ser um “país de emigração” – mesmo nos momentos em que a imigração surgiu como fenómeno relevante –, a emigração portuguesa dos nossos dias é substancialmente diferente da de outrora (não estamos “como na década de sessenta”…), quer no que diz respeito aos perfis sociais dos migrantes, quer no que diz respeito à configuração, temporalidades, finalidades e destinos dos movimentos. Apesar destas mudanças – sublinhou também o meu anterior artigo –, são ainda os portugueses com menos capital escolar e inserções profissionais menos qualificadas e mais ameaçadas pelo desemprego que maioritariamente saem do país, havendo também muitos emigrantes que, tendo qualificação académica de nível superior, não encontram nos países de destino ocupação “à altura” dessa qualificação, experimentando por isso trajetórias de relativa desqualificação profissional e social.

Uma quarta ideia que o meu último artigo sublinhava referia-se à oposição entre “liberdade” e “constrangimento” que anima muitos dos debates sobre os movimentos emigratórios típicos dos nossos dias. Dizia eu nessa altura que, neste debate, as posições tendem a extremar-se, opondo os que celebram a “oportunidade” que a emigração constitui enquanto “escolha” de quem, num “mundo globalizado”, abraça com “confiança” o “desafio” da “mobilidade” e da “internacionalização” àqueles que peroram acerca das “novas malas de cartão”, do país que “empurra para fora” os seus jovens e do “exílio forçado” que a emigração constitui.

Ora, o que a investigação sociológica sobre as migrações nos diz, para além de impor o reconhecimento da complexidade de que hoje se revestem os movimentos migratórios, é que este fenómeno não é nem o produto de deliberações “racionais” e “plenamente informadas” de agentes empenhados em garantir a maximização dos seus proveitos potenciais, nem o resultado “mecânico”, “inevitável”, de estruturas económicas e sociais funcionando como “máquinas de fazer emigrantes”. Sendo certo que os problemas atuais da nossa economia atuam como fatores propulsores da emigração, nem todos os desempregados emigram, para dar apenas um exemplo; da mesma forma, países há que, com situações semelhantes ou até mais pressionantes do que a nossa, não registam uma taxa de emigração da sua população residente tão elevada quanto a que Portugal observa. Por outro lado, poucos domínios da vida pessoal e familiar serão porventura tão perpassados por aspetos “irracionais”, ou melhor, emocionais, como o que respeita à decisão de abandonar um grupo doméstico, uma coletividade, um país. Quero com isto dizer que é no encontro entre um conjunto de condições “objetivas” – uma “estrutura de oportunidades”, como por vezes lhe chamam os sociólogos – e um conjunto de condições “subjetivas”, inscritas nos corpos e nas mentes dos indivíduos e partilhadas no interior dos respetivos grupos de pertença, que devem ser procuradas, para lá da dicotomia redutora que opõe a “liberdade” à “compulsão”, as razões explicativas da decisão de emigrar. O esclarecimento dos termos e propriedades deste encontro só a investigação detalhada, no terreno, realizada junto dos migrantes, atuais ou potenciais, pode alcançar. Prossiga-se, pois, esse esforço investigativo – que o campo científico tem retomado com bastante vitalidade nos últimos anos, mesmo se os recursos para o fazer escasseiam –, pois sem ele o debate público sobre esta matéria continuará irremediavelmente prisioneiro de ideias feitas, “gritos de alma” ou querelas político-partidárias.

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