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Cultura

JUP RETROSPETIVA: OS MELHORES CONCERTOS DE 2018

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Os dias passam a correr e nem sempre temos o tempo desejado para processar ou digerir tudo o que acontece ao nosso redor. As retrospetivas permitem analisar as coisas com mais calma. Elas ajudam-nos a construir as imagens mentais de mais um ano cheio de tonalidades distintas e a admirar o que de melhor ele nos ofereceu.

O JUP volta a aproveitar os últimos dias de dezembro para fazer essa retrospetiva. Olhamos hoje para aqueles que consideramos os melhores concertos de 2018. Hoje as nossas escolhas são estas. Amanhã podemos ter uma mudança de coração que nos obriga a reformular as nossas pequenas listas completamente. As retrospetivas têm destas coisas engraçadas.

Mas por agora fica a celebração. 2018 foi um ano cheio para o mundo da Cultura e 2019 já está aí à espreita.

Colour Haze, Hard Club, 19 de maio

Fotografia: Hugo Adelino / WAV.

Fotografia: Hugo Adelino / WAV.

 

Corria o mês de maio e antecipava-se o início da época de festivais, mas o regresso da banda germânica ficou-se pela data única no Hard Club. Depois da edição de 2017 do Sonic Blast Moledo, a banda voltou para novo concerto, agora em recinto fechado. O que se deparou foi algo que apenas fica escrito na memória dos presentes.

Começando com o tema homónimo do álbum de 2012, She Said, os ouvidos da plateia aqueceram-se para um concerto de duas horas. O riff que se seguia trouxe logo um largo sorriso ao público, tratando-se de nada mais nada menos do que um dos maiores êxitos do trio, “Aquamaria”. Passando por diversos temas de quase toda a sua discografia de estúdio, o concerto desenvolveu-se dentro dos contornos do stoner psicadélico para uma experiência transcendente. As horas eletrizantes, que colaram o público à magia dos dedos de Stefan Koglek, culminaram num encore que contou com outro dos vários grandes temas dos Colour Haze, “Love”.

Os presentes no concerto do trio na noite minhota no ano anterior certamente podem falar de um concerto memorável; os presentes na noite primaveril na baixa portuense podem tentar descrever algo ainda mais impressionante. Faltam palavras para a construção musical que rodeia aqueles três músicos: começando, quase sempre, com um simples riff, a banda progride para algo de proporções épicas. A criatividade do que é possível fazer com três instrumentos e uma afinação um ou dois tons abaixo do normal foi explicada com poucas palavras, mas muita música pela banda de Munique.

Francisco Cardoso

Tyler, The Creator, NOS Primavera Sound, 7 de junho

Fotografia: Sofia Silva.

Fotografia: Sofia Matos Silva.

O primeiro dia da edição de 2018 do Primavera teria sido um bastante calmo (ainda que emotivo), se não fosse pelo furacão Tyler. O rapper do coletivo Odd Future chegou ao Palco SEAT com todos os motores ligados e o pé a fundo no acelerador. A revolta, a dor, o amor e a alegria das suas composições fundiram-se para criar momentos únicos.

Sozinho em palco, Tyler, The Creator protagonizou o concerto mais efusivo do festival. Sozinho, mas também não seria necessária qualquer companhia. A tempestade rapidamente se tornou num super tufão: Tyler saltava ininterruptamente, com uma energia explosiva, e o público saltava com ele. Poderia dizer-se que tinha o público enrolado em redor do seu dedo mindinho, tal era o nível de interação e a resposta que conseguia.

A organização do festival conseguiu, este ano, reunir três dos mais importantes nomes do hip-hop atual: Tyler, The Creator, Vince Staples e A$AP Rocky. Admito que foi bastante difícil escolher apenas um destes três. No entanto, a reação que o músico californiano conseguiu despoletar da audiência conseguiu-lhe o pódio.

Apesar de Flower Boy ter sido o álbum que lhe garantiu a atenção mediática atual, foi com músicas dos três trabalhos anteriores que conseguiu levar a multidão à loucura. “IFHY”, de Wolf, foi a música que mais se destacou, pela força e emoção pura que Tyler emprega nas palavras, despejadas como balas. Paradoxalmente a esta agressividade, Tyler conseguiu também alguns momentos mais descontraídos; “November” e “911/ Mr. Lonely” foram momentos que ficarão na memória de todos os presentes. 

Sofia Matos Silva

Nick Cave & The Bad Seeds, NOS Primavera Sound, 9 junho

Fotografia: Nicole Gonçalves (ex colaboradora do JUP)

Fotografia: Nicole Gonçalves, canal180.

Um dos artistas mais conceituados da sua geração, e um dos nomes mais esperados no mundo dos festivais de verão, Nick Cave – acompanhado da sua banda, The Bad Seeds – produziu uma noite que nenhum dilúvio podia parar.

Não há muito que possa faltar na longa carreira de Nick Cave: se este foi apenas mais um concerto na sua vida, nas vidas de quem o viu não foi algo normal. É a música, é a qualidade dos músicos, é a ligação com o público, é toda uma performance que resulta de um amor à arte por parte da banda, e é um público que não consegue resistir sentir esse mesmo amor.

Foi o primeiro concerto em Portugal da banda australiana depois do lançamento de Skeleton Tree e depois da tragédia na vida pessoal de Nick Cave, a morte do seu filho de 15 anos. A dor ainda era visível, os sentimentos transmitidos nas músicas foram palpitáveis. Mas Nick Cave faz da música a sua terapia, e, pelo caminho, proporciona momentos inesquecíveis a quem encontra pelo seu caminho.

Alguns dias antes do concerto no Porto, aparecia pelas redes sociais um artigo com o nome “All artists are disappointing live after seeing Nick Cave” (em português, “Todos os artistas são dececionantes ao vivo depois de se ver Nick Cave”). À falta de melhores palavras, esta frase resume perfeitamente o que se passou na noite de 9 de junho no Porto.

Francisco Cardoso

Øresund Space Collective, Woodstock 69 Rock Bar, 29 de junho

Fotografia: Hugo Adelino / WAV.

Fotografia: Hugo Adelino / WAV.

 

Este coletivo foi um dos grandes nomes que passou pelo pequeno bar de Campanhã e, à semelhança desses outros nomes, o concerto presenteado foi digno dos grandes palcos nacionais. Talvez pelo tamanho do palco, pela decoração e pelo ambiente hospitaleiro do Woodstock 69 Rock Bar, foram dezenas de concertos que por lá passaram em 2018, e todos surpreenderam. De forma positiva.

Uma banda de improviso, o space rock, a “aura” da sua grande figura, Scott Heller (ou Dr. Space), um investigador sobre diabetes e músico part-time. É difícil de prever o que pode surgir de um coletivo assim. É difícil também de entender, mesmo após os ver. Vestido de feiticeiro, o homem que faz do seu instrumento uma misteriosa caixa deseja uma boa viagem à plateia.

Um concerto dos Øresund Space Collective é facilmente comparável a uma viagem pelo espaço: é uma aventura tanto para os músicos como para o público, há uma boa disposição permanente, e um gosto na arte que se cria. Esta arte é momentânea e única, sem repetições, e vive da espontaneidade; não é possível recriar os momentos que eles proporcionam.

Tema após tema, ou viagem atrás de viagem, foram duas horas de êxtase total, em que a arte do conjunto dinamarquês ficou gravada nos anais musicais do ano.

Francisco Cardoso

Naxatras, Sonic Blast, 11 de agosto

Fotografia: Daniel Jesus.

Fotografia: Daniel Jesus / Música em DX.

 

Depois de lançar um dos melhores álbuns do ano, o trio grego foi uma das confirmações mais esperadas do festival de Moledo. Na sua estreia em Portugal, abriram o palco principal no último dia do Sonic Blast, e enganaram quem pensa que só nas horas mais tardias dos festivais de verão se encontram as melhores bandas.

Os Naxatras subiram ao palco pouco depois das 18h00, e proporcionaram um dos melhores concertos da oitava edição do festival. Com um género musical perfeitamente enquadrado naquilo que o festival minhoto oferece, o final de tarde foi perfeito para que a banda de Tessalónica se apresentasse ao público português – e claro, ao espanhol, sempre com uma presença muito forte no Sonic Blast.

Em pouco mais de 40 minutos, a banda demonstrou toda a sua qualidade, para um público bem preparado – não tivesse sido o concerto anterior, no Pool Stage, a viagem louca de improviso dos Electric Octopus. Munida de um balanço que os remete tanto para os lados do blues como do psych stoner, a banda grega não tem uma presença em palco particularmente chamativa, mas a sua qualidade e a entrega à música fazem das suas performances algo de memorável.

Francisco Cardoso

Jungle, Paredes de Coura, 16 de agosto

Fotografia: Hugo Lima / fotógrafo oficial.

Fotografia: Hugo Lima / fotógrafo oficial.

Jungle foi a banda que mais me surpreendeu este ano.

Estes sete londrinos caíram de paraquedas no anfiteatro natural courense, cantaram e encantaram. Tendo apenas um álbum publicado até à data do concerto e uma carreira relativamente recente, o coletivo musical era desconhecido para muitos dos presentes. No entanto, as primeiras notas tocadas foram suficientes para conquistar o público.

A encosta do rio Coura metamorfoseou-se numa gigantesca pista de dança num intervalo de poucos minutos. Músicas como “Busy Earnin” e as acabadinhas de sair do forno “Happy Man” e “Heavy, California” tornaram impossível não bater o pezinho.

A energia brotou do palco, percorreu cada um dos presentes e tornou-se numa imensa onda coletiva. Miúdos e graúdos deixaram-se levar por este modern soul mágico; a banda ganhou, certamente, fãs leais para a vida.

A atuar minutos depois de Fleet Foxes, e no mesmo cartaz de nomes como Slowdive e Arcade Fire, os Jungle não se deixaram intimidar e fizeram maravilhas acontecer. Desde então, o público português já teve a oportunidade de usufruir mais uma vez dos ritmos alegres deste coletivo, no Super Bock em Stock, onde apresentaram o novo álbum, For Ever.

Sofia Matos Silva

Throes + The Shine, Indie Music Fest, 31 de agosto

Fotografia: Sofia Matos Silva.

Fotografia: Sofia Matos Silva.

A fusão rock-kuduro ganhou merecidamente a posição de melhor concerto do Indie Music Fest 2018. Apesar de a sexta edição do micro-festival de Baltar ter sido preenchida por excelentes concertos – como o dinossauro do hip-hop, Mundo Segundo, e o rapaz do futuro, Conan Osiris -, os Throes + The Shine descobriram o desejo secreto dos indies e libertaram a selva em Paredes.

A temperatura no Bosque do Choupal aqueceu até chegar a tropical com a energia impressionante de Mob, o vocalista da banda. Subiu a estrutura do palco, fez mortais, atirou-se para cima do público, dançou com este (e no meio deste), caiu do palco – tudo isto sem parar de dançar. “Nunca parar de dançar” também pareceu ser o lema dos festivaleiros.

Entrando num domínio mais subjetivo, para quem estava no poço do palco a olhar para a multidão, este foi um dos concertos mais incríveis de sempre. A alegria estampada na cara desta tribo, aninhada no seio das árvores, as luzes dançantes, o ritmo (que poderia estar a ser tocado pelo flautista mágico de Shrek) intenso e rápido, um Mob a voar por cima da cabeça… irrepetível (infelizmente) e impossível de esquecer.

Sofia Matos Silva

Elder, Hard Club, 11 de novembro

Fotografia: Bruno Pereira / WAV.

Fotografia: Bruno Pereira / WAV.

À semelhança dos Colour Haze, os Elder também haviam sido cabeças de cartaz na edição de 2017 do Sonic Blast. No entanto, ao contrário dos germânicos, a banda de Boston proporcionou um concerto bastante mediano no festival de Moledo. Regressaram em 2018 para dois concertos em recinto fechado, no Porto e em Lisboa.

O Hard Club foi a casa para a banda de stoner, que trouxe uma surpresa ao público da Invicta: Dr. Space, dos já acima mencionados Øresund Space Collective, atuou como convidado especial em duas músicas. Os norte-americanos não perderam tempo e abriram com o hit do último disco, “Sanctuary”. Dizem que se deve deixar o melhor para o final; bem, os Elder deixaram o melhor para o concerto todo. Não ouve preparação, nem um aviso: foi um peso monumental do início ao fim.

O concerto a um domingo à noite pode ter afastado algum público, mas os resistentes que marcaram presença nas duas horas de música não tiveram qualquer arrependimento. A banda que conjuga elementos progressivos, psicadélicos e stoner alimentou-se do frio da noite de novembro para proporcionar um momento musical único, passando dos seus mais icónicos riffs e breaks com bastantes pontes para improvisos com tremenda qualidade.

Francisco Cardoso

Kikagaku Moyo, CCOP, 2 de dezembro

Fotografia: Sofia Matos Silva.

Fotografia: Sofia Matos Silva.

幾何学模様は 美しいです。

Os Kikagaku Moyo são das bandas mais lindas do momento – e isto não é exagero. A banda japonesa gosta imenso de vir a Portugal, e nós gostamos imenso dela. Gosta tanto que o último álbum, Masana Temples, foi gravado nos estúdios Valentim de Carvalho, em Lisboa (e produzido por Bruno Pernadas).

O concerto do segundo dia de dezembro, para muitos, abriu a época natalícia, tal foi o amor que se sentiu na sala do Centro Católico de Operários do Porto (CCOP). Deixando a abertura nas mãos capazes dos GÃRGOOLA, o quinteto enfeitiçou o público mal pegou nos instrumentos. São momentos bastante difíceis de passar para palavras, sinceramente.

Kikagaku Moyo é como adormecer e mergulhar no melhor dos sonhos. A felicidade é simples e pura; pode ser cortada por alguns caminhos irregulares e sombrios, mas acaba sempre tudo bem. O público permaneceu embalado no decorrer do concerto, como se num transe.

Qualquer problema ou dúvida existencial que tivesse passado pela cabeça durante o dia dissipou-se durante este concerto terapêutico. Eu senti isso, e mantive um sorriso honesto como o destes simpáticos japoneses o tempo todo em que as notas musicais se fizeram ouvir.

Sofia Matos Silva

Linda Martini, Maus Hábitos, 12 de dezembro

Fotografia: Sofia Matos Silva.

Fotografia: Sofia Matos Silva.

Os Linda Martini são aquela banda que arrasta uma multidão para onde quer que vá. Esta tour de clubes estreou o conceito de deixar o público decidir a setlist. Não que tal fosse necessário; com este quarteto, uma excelente atuação é sempre garantida.

Mesmo a dar o sétimo concerto seguido no espaço de oito dias, o grupo deu tudo o que tinha – e talvez até um pouco mais. As expressões faciais de esforço fundiram-se com as de alegria, em cima do palco e fora dele. Sim, porque este é um público irrequieto e exigente. Os moshes sucederam-se e o indie todos uniu, num concerto que marcou profundamente todos os presentes.

Na fila da frente, temo que alguns exorcismos tenham sido executados, tal era a velocidade a que cabeças e braços abanavam e a complexidade da libertação do próprio e entrega à música. Nos moshes, misturaram-se jovens e não tão jovens – e de copo de cerveja na mão, se fosse preciso.

Desta noite, trago imensas memórias comigo. A mais emblemática é a da sala esgotada dos Maus Hábitos a berrar em uníssono, e a plenos pulmões, “foder é perto de te amar, se eu não ficar perto.”

Sofia Matos Silva