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Educação

Novas licenciaturas da UP: balanço do primeiro ano

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Reitoria da Universidade do Porto | Foto: U. Porto

No ano letivo de 2022/2023, o financiamento do PRR permitiu a abertura de três novos cursos de primeiro ciclo – a Licenciatura em Desenho, a Licenciatura em Literatura e Estudos Interartes e a Licenciatura em Matemática Aplicada. Um ano depois, o JUP convidou os diretores destes cursos a refletirem sobre o aumento da oferta formativa na Universidade do Porto.

 

Uma parte das verbas do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) tem sido direcionada para o desenvolvimento da competitividade do ensino superior, alargando a oferta formativa em áreas emergentes e atraindo novos estudantes, desde jovens que terminaram o ensino secundário, até adultos já integrados no mercado de trabalho. 

No caso da Universidade do Porto, a aposta é no aumento e diversificação de cursos nas áreas STEAM (Sciences, Technologies, Engineering, Arts and Mathematics, ou em português, Ciências, Tecnologias, Engenharia, Artes e Matemática).

Em particular, no ano de 2022/23, surgiram a Licenciatura em Desenho (Faculdade de Belas Artes, FABUP), a Licenciatura em Literatura e Estudos Interartes (Faculdade de Letras, FLUP) e a Licenciatura em Matemática Aplicada (Faculdade de Ciências, FCUP). Recorde-se que, mais recentemente, a FCUP estreou também a Licenciatura em Bioinformática.

 

Licenciatura em Desenho

Segundo o Professor Paulo Luís Almeida, Diretor da Licenciatura em Desenho na FBAUP, este novo curso “veio dar um corpo visível ao que era uma necessidade silenciosa“.

Questionado sobre as origens da licenciatura, o responsável pelo curso responde que a mesma “surge das transformações que ocorreram desde a década de 1990 no desenho, nas suas práticas, ensino e aplicações profissionais”.

Aprofundando esta contextualização histórica, o Professor detalha que “o ensino de desenho estava associado ao projeto no âmbito de outras disciplinas, artísticas e não só”. Em particular, “no campo artístico, o desenho é a prática através da qual diferentes estudantes entram em diálogo com os discursos, prática artística e a cultura visual do seu tempo”.

Para o docente, “esta função é hoje tão fundamental como foi no passado”. Mas o presente traz novos desafios e “percebemos que a paisagem artística e cultural onde o desenho tradicionalmente se faz mudou radicalmente”

Acrescenta que, ao longo do tempo, “apareceram e revitalizaram-se áreas profissionais e investigativas fortemente dependentes do desenho, sobretudo no âmbito audiovisual”. Por esta razão, “era fundamental que a Universidade do Porto acompanhasse estas transformações, em linha com o que já ocorria em outras universidades europeias”.

“A Licenciatura em Desenho está focada nas interseções que ocorrem quando o desenho se situa entre a prática artística, as narrativas gráficas, as áreas STEM e as rápidas transformações que a transição digital tem trazido à cultura visual.”

Tanto na primeira edição, em 2022/23, como este ano, a Licenciatura em Desenho contou com cerca de 25 vagas. Paulo Luís Almeida comenta este sucesso, observando que “as vagas têm sido preenchidas com estudantes altamente motivados. Estou certo que, abrindo mais vagas, elas continuariam a ser preenchidas com estudantes capazes de contribuir para as transformações que procuramos e necessidades que antevemos”. 

Contudo, um aumento de vagas não está nos planos da FBAUP, que aposta em “manter uma relação de proximidade e presença entre estudantes e corpo docente. Um aumento de vagas poderia comprometer a lógica de proximidade que queremos cultivar”, refere o diretor do curso.

Também sobre números, destacam-se as médias dos últimos colocados, que, em ambas as edições, se têm fixado em valores semelhantes aos da Licenciatura em Artes Plásticas, o curso de referência da FBAUP. O Professor esclarece que “as médias de entrada, sabemo-lo, têm uma importância relativa no percurso feito no ensino superior, [mas,] mais do que a média, interessa-nos a motivação e a capacidade de adaptação de cada estudante”. 

Quando questionado sobre o que distingue a Licenciatura em Artes Plásticas desta nova Licenciatura em Desenho, o diretor do curso responde que, “estando situado entre dois mundos – a Arte e o Design – o desenho é uma terceira área de conhecimento que cruza com outras matérias da Universidade”. Esclarece que a diferença reside nas áreas de especialização e no foco de cada uma das licenciaturas. “Embora a formação em desenho partilhe um espaço e uma base formativa com as Artes Plásticas e o Design, é, no entanto, diferenciada, independente e autónoma.” Em particular, “a Licenciatura em Desenho está focada nas interseções que ocorrem quando o desenho se situa entre a prática artística, as narrativas gráficas, as áreas STEM e as rápidas transformações que a transição digital tem trazido à cultura visual”.

Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto. Fonte: FBAUP

Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto. | Fonte: FBAUP

Licenciatura em Literatura e Estudos Interartes

Segundo a Professora Ana Paula Mendes, Diretora da Licenciatura em Literatura e Estudos Interartes na FLUP, “o curso já havia sido pensado e apresentado à A3ES em 2021”. 

Questionada sobre se a licenciatura surge com a necessidade de aplicar fundos europeus, ou era já uma ambição antiga da faculdade, a Professora responde que a mesma foi pensada “como uma oferta educativa que fosse ao encontro de uma formação literária numa perspetiva interdisciplinar e interartística, capaz de responder a diferentes desafios e solicitações do universo da Cultura na sociedade contemporânea”.    

Desde a primeira edição, em 2022/23, que a FLUP tem apostado fortemente nesta licenciatura, contando com cerca de 50 vagas. Algo que não estava nos planos iniciais da faculdade, pois, “no início, tínhamos pensado num número inferior de vagas anuais”.

“Trata-se de uma forma mais arrojada, atualizada, de lidar com a cultura literária, incluindo também um pequeno estágio em instituições culturais.”

Para Ana Paula Mendes, o ensino deve ser próximo dos estudantes. Acrescenta que “não estamos interessados em massificar esta formação, de modo a poder proporcionar um melhor acompanhamento pedagógico ao longo dos três anos”.

Também as médias dos últimos colocados em cada ano têm sido relativamente elevadas para uma nova licenciatura, aproximando-se de valores semelhantes aos que se verificam noutras licenciaturas, no domínio das Línguas, Literaturas e Culturas, e existentes em várias instituições do país, incluindo na FLUP.

Segundo a docente, há vários fatores que podem explicar este sucesso. Se, por um lado, “o prestígio da formação, em geral, na UP, e no caso concreto na FLUP, tem influência na escolha dos estudantes, julgo que o nível de adesão a este novo curso tem a ver também, ou sobretudo, com o facto de ser uma formação que cruza o estudo da literatura portuguesa com outras literaturas. Trata-se de uma forma mais arrojada, atualizada, de lidar com a cultura literária, incluindo também um pequeno estágio em instituições culturais, no último semestre”.

Licenciatura em Matemática Aplicada

Nos últimos 10 anos, a oferta de cursos na FCUP aumentou de 11 para 17 licenciaturas. Contudo, a nova Licenciatura em Matemática Aplicada não é propriamente uma estreia. Para os mais atentos, o edifício FC1 ainda conserva os vestígios da sua antiga divisão em dois departamentos – o Departamento de Matemática Pura e o Departamento de Matemática Aplicada – que foram fundidos em 2009, ano em que a FCUP procedeu a uma revisão profunda nos seus estatutos.

Segundo a Professora Rita Gaio, Diretora da Licenciatura em Matemática Aplicada na FCUP, “já tinham sido feitas tentativas anteriores de criação desta licenciatura, que não se concretizaram por falta de financiamento”.

Na primeira edição, o curso contou com 40 vagas, e este ano o número subiu para 55, igualando a oferta da Licenciatura em Matemática. Também as médias de entrada dos últimos colocados são bastante próximas, algo que deixa a diretora do curso “muito satisfeita”.

Nos últimos anos, a FCUP tem apostado fortemente em licenciaturas no domínio da matemática e computação, tendo estreado recentemente a Licenciatura em Bioinformática e a Licenciatura em Inteligência Artificial e Ciência de Dados. Questionada sobre o que distingue a Licenciatura em Matemática Aplicada dos outros novos cursos, a docente esclarece que “há uma formação base em Matemática que é necessária”

A Licenciatura em Matemática Aplicada é o curso certo para “um estudante que goste de matemática e que pretende usá-la para fazer a diferença na sociedade”.

Acrescenta que o enquadramento deste curso “nas áreas STEAM inclui também unidades curriculares obrigatórias em Física e Ciência de Computadores, direcionadas para as aplicações da Matemática”.

Em relação ao plano de estudos, verifica-se que a grande maioria das unidades curriculares da Licenciatura em Matemática Aplicada podem igualmente ser frequentadas através da Licenciatura em Matemática. A Professora assinala que esta característica é “uma condicionante”, mas que está “contente com o plano”. 

Detalha ainda que o curso precisou de “ser adaptado ao corpo docente, que é muito solicitado para dar aulas. Foi necessário fazer um esforço e gerir os recursos do departamento, recorrendo a áreas específicas que já existem na Licenciatura em Matemática”.

Para concluir, Rita Gaio esclarece que este é o curso certo para “um estudante que goste de matemática e que pretende usá-la para fazer a diferença na sociedade”. Acrescenta que se trata de uma “excelente formação inicial, e que tem uma procura muito elevada no mercado de trabalho”.

Departamento de Matemática da FCUP. Fotografia: Rui Costa Miranda

Departamento de Matemática da FCUP. | Fotografia: Rui Costa Miranda

Existem cursos a mais no nosso país?

Portugal conta atualmente com cerca de 4.400 cursos superiores, distribuídos por um total de 97 instituições públicas e privadas. Destes, mais de metade correspondem a mestrados. Para comparação, Espanha possui 3.700 cursos e perto de 70 instituições de ensino superior.

Ao mesmo tempo, se o número de alunos no ensino superior em Portugal bateu um recorde absoluto no ano 2022/23, com um total de 446 028 inscritos, Espanha ultrapassa os 2,5 milhões de estudantes no ensino superior.

Estes dados são avançados pelo presidente da Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (A3ES), João Guerreiro, numa recente entrevista ao portal de notícias SAPO 24. O presidente da AE3S apontou a existência de um “número de cursos excessivo” em Portugal, acrescentando que “na realidade não há instrumentos para disciplinar isto”. 

“A primeira consequência é que não há estudantes para todos estes cursos. Depois, nota-se alguma concorrência entre as instituições, quer dizer, quando um curso tem êxito num lado as outras instituições tendem a definir cursos nessas áreas, porque percebem que há procura.”

João Guerreiro apelou, também, a que o aumento da oferta no ensino superior seja pensado para capacitar as instituições do interior, responsáveis pela dinamização das zonas mais esquecidas do país. “Temos valorizado em excesso – a culpa é nossa, da sociedade – a concentração nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto; pessoas, atividades desportivas, lúdicas, culturais, até de projeção internacional. Há uns anos falava-se na macrocefalia de Lisboa, hoje tem de se falar na macrocefalia de Lisboa e do Porto.”

Um investimento no futuro

O financiamento para a criação destas licenciaturas e outros cursos de curta e longa duração advém do Plano de Recuperação e Resiliência, um programa de aplicação nacional de fundos da Comunidade Europeia no âmbito do quadro de incentivo Next Generation EU, para a recuperação económica dos vários estados membros após a pandemia de Covid-19

O plano tem um período de execução até ao ano de 2026, e visa implementar um conjunto de reformas e investimentos para reforçar a convergência de Portugal com os países mais desenvolvidos da Europa ao longo da próxima década.

 

Artigo por: Rui Costa Miranda

Editado por: Inês Miranda e Carina Seabra