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Artigo de Opinião

Noruega 2021, o turno da esquerda

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No passado dia 13 de setembro, o eleitorado norueguês foi chamado a votar para escolher um novo Parlamento. À semelhança do que as sondagens iam apontando, o Partido Trabalhista (centro-esquerda) voltou a ser o partido mais votado, obtendo também o maior número de deputados, como o é desde 1927. Embora nem sempre esse facto tenha permitido aos trabalhistas noruegueses governar, os resultados deste mês demonstram a clara intenção do povo deste país nórdico em terem um governo liderado pela esquerda.

Por seu lado, a coligação de centro-direita incumbente sofreu uma pesada derrota, com os Conservadores, liderados pela Primeira-Ministra (PM) dos últimos oito anos, Erna Solberg, a assumirem a derrota e o fim da governação deste bloco.

Agora, é esperado que Jonas Gahr Støre, líder dos trabalhistas, assuma a liderança do Governo, o que fará com que pela primeira vez desde 2001 (ou desde 1959, se incluir a Islândia), todos os países Nórdicos tenham PMs de esquerda. Para tal terá de formar uma coligação, como é hábito naquele país, contando-se que forme uma “geringonça” entre o Partido Trabalhista, o Partido do Centro (agrarianismo, terceira força política) e o Partido da Esquerda Socialista (socialismo democrático, quinta força). Porém, esta coligação à esquerda poderá enfrentar alguns problemas vitais à sua existência e continuidade durante a legislatura (note-se que, ao contrário do que ocorre em Portugal, não há hipóteses de eleições antecipadas na Noruega).

Primeiro: Os expectáveis parceiros de coligação dos trabalhistas advogam contra a união económica com a UE sem direitos políticos ou influência sobre as decisões da União, denotando algum eurocepticismo, uma vez que a Noruega não faz parte do bloco da União. Gahr Støre, por seu lado, quer manter os laços económicos UE-Noruega como estão. Por outras palavras, a Noruega pertence ao Espaço Económico Europeu (EEE), permitindo o livre comércio com a UE, mas não tem assento nas reuniões da União e no Parlamento Europeu onde se decidem as políticas que afetam a EEE, o que deixa a Noruega numa posição de fragilidade e impotência.

Segundo: Partido do Centro e Partido da Esquerda Socialista, ambos defensores de uma economia mais verde e com foco no ambientalismo, querem o fim da extração de petróleo no Mar do Norte por parte da Noruega, principal fonte de riqueza do país. A questão do “outro negro” coloca-se na intenção dos trabalhistas em tornar a economiado país mais verde, com mais energias renováveis, indo ao encontro da tão importante questão climática e da contenção do aquecimento global, mas sem terminar abruptamente com a extração de petróleo, mantendo-a apenas para exportação.

Apesar destes pontos tensos, se Jonas Gahr Støre conseguir uma coligação entre estes três partidos, terá a vantagem de não necessitar de depender de partidos com posições mais radicais como o comunista Red ou os Verdes noruegueses, uma vantagem importante para que o Governo possa ter mais estabilidade para tomar certas medidas e reformas necessárias. Para além disso, a busca por um futuro mais verde poderá ser mesmo o ponto conciliador da coligação que, unida, adote uma posição de urgência – mas não radical – sobre o ambiente e a crise climática.

Certo é, num país que junto com os seus vizinhos nórdicos é um bastião da social-democracia na Europa, tendo experimentado, nas últimas décadas, a governação de direita dos Conservadores e dos Liberais, com o aumento das desigualdades associado às políticas neoliberais e privatizações, e pretendendo ainda lidar com a questão climática e a inevitabilidade de tornar a economia mais verde, a Noruega virará à esquerda, cansada da direita neoliberal e sonhando com um futuro mais justo, igual e verde, como lhe promete o líder trabalhista.

 

Artigo da autoria de Pedro André Pinheiro