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Crónica

UM DIA DAQUELES (DE GREVE)

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Beatriz Carneiro

Eram 6h quando saí de casa para ir para as aulas. Mal passei a porta do prédio, encontrei o céu ainda escuro e a lua ainda a brilhar intensamente. Eram 6h da manhã quando saí de casa, houve greve dos autocarros.

Percorri o meu caminho até ao ponto onde me iria encontrar com outro alguém que, da mesma forma que eu, teve de arranjar outra maneira para chegar ao outro lado da cidade. À medida que os meus pés percorriam o passeio de paralelos amarelos, deixei de sentir as mãos, o frio congelava o meu rosto e não parecia haver nada entre a minha pele e o vento que corria e brincava de um lado para o outro. Encontrei, algures a meio do meu percurso, uma senhora já minha conhecida que, ofegante do trajeto que já tinha andado e do que ainda tinha para andar, falava com certa dificuldade. Também ela partilhava da minha insatisfação em relação à quase inexistência de autocarros, contando-me das pessoas que se tinham aventurado pelas ruas, independentes de qualquer transporte, apoiando nas pernas, todo um corpo sonolento e fatigado.

Nestes dias há que arranjar soluções. E assim, mesmo que um pouco rabugentos, vamos até à estação de comboios, saímos em determinado lugar, vamos de boleia com o metro em que, só por acaso, as pessoas parecem sardinhas enlatadas, completamente coladas umas às outras e subimos aquela rua, com aquelas escadas, devidamente construídas, em que cada degrau tem uma altura diferente.

Foi uma manhã passada em anfiteatros, ouvindo discursos evidentemente bem preparados e elaborados, aproveitando um intervalo bastante alargado, em que dois espécimes, que conseguem fazer rir qualquer um, mesmo aqueles que só dormiram três horas na noite anterior, me fizeram esquecer da maratona que já tinha percorrido. Chegou, inevitavelmente, a hora de voltar para casa, restava saber como.

Considerei diversas e variadas possibilidades e ainda discuti se, por um acaso do destino, algum 901 passaria, abrindo as portas para eu entrar e aconchegando-me com aquele aquecedor deveras maravilhoso em tempos de baixas temperaturas. Mas o comboio esperava-me, ou melhor, eu esperava pelo comboio, na estação dos azulejos azuis e dos bancos verdes de jardim. Esperei durante vinte minutos.

Pela janela do suburbano passavam quentes raios de sol, via-se o rio parado, as folhas a caírem das árvores, os carros a passarem na ponte, uma cidade na agitação do dia. Mais à frente do lugar onde eu estava, um rapaz folheava um livro e uma senhora aproveitava para dormir. Ouviam-se gargalhadas vindas de lá de trás e alguém a falar ao telemóvel. Dei por mim a gostar daquela viagem em que me vi obrigada a embarcar. Mas saí às 6h de casa, houve greve dos autocarros.

Saudações aos que têm carro.

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