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Artigo de Opinião

COLAR CARTAZES

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Não sou do Bloco de Esquerda, posso concordar com algumas das suas opiniões, mas há sempre aquele momento em que a nódoa cai no pano branco. Esse momento chegou para o Bloco. Que fique patente ainda que eu, sendo católico praticante, não fiquei ofendido com os cartazes que continham a frase “Jesus também tinha dois pais.”. Achei-lhe piada até, porque a frase não é nova, é já usada nos Estados Unidos da América há bastantes anos para, de certa forma, tentar sobrepor-se à crença da Igreja Católica que casal é um homem e uma mulher e adotar não é de todo uma possibilidade a ponderar.

Não sei o que se passa com este país, mas parece que a forma de comunicação política mais básica (o cartaz) ainda não é dominada plenamente. O Partido Socialista espeta-se nas eleições legislativas com cartazes que não têm ponta de verdade, o Bloco de Esquerda não tem atenção à realidade social que se vive neste país. Não me tomem por conservador, que não o sou, mas este país, por mais progressivo que pareça no papel, na rua é diferente. Vemos ainda uma sociedade patriarca marcada por fortes ligações à Igreja Católica durante centenas e centenas de anos. E um partido que não olha para a realidade social é um partido que obviamente nunca vai governar. Apesar disso, dando a possibilidade de governar, como aconteceu nas últimas legislativas, escolhe ficar de fora do governo, não por ser oposição, mas por ser simplesmente do contra.

A comunicação política foi algo que sempre falhou redondamente neste país (só funcionou no caso de José Sócrates que atingiu uma maioria absoluta no primeiro mandato e ganhou o segundo), e aqui está mais um caso bicudo. Obviamente, temos que pensar nos motivos que levaram a direção (coordenação, liderança, chamem-lhe o que quiserem.) do Bloco a aprovar estes cartazes.

Será gozo, provocação? Se sim, temos que nos perguntar porquê. Sei que a Igreja Católica não é força com que se brinque, mas ninguém é mais soberano que os portugueses representados na Assembleia da República. Se houve uma aprovação do diploma legal que permite e regula a adoção plena por parte de casais do mesmo sexo, a Igreja Católica reclama, mas eventualmente vai calar e engolir, tal como aconteceu com o aborto e com o casamento entre pessoas do mesmo sexo que agora são direitos adquiridos dos portugueses, que, por isso, são mais felizes. Pressões vão haver sempre, mas é preciso viver com elas.

A Igreja vai estar sempre relacionada com a política enquanto este país for católico de costumes, pelo que esta situação dos cartazes foi um tiro no pé do partido que fez a melhor campanha tanto a nível de legislativas, como a nível de presidenciais. Mas já não chega a religião estar ligada à sociedade, é preciso ainda agitar as águas desta forma? Apesar de tudo, vivemos num Estado de Direito Laico, por isso ainda que a religião tente mover-se nos meandros da política, a reciprocidade não se aplica, ou não se deve aplicar, senão acontecem situações destas. A imagem cuidada de partido progressivo, moderado e de apoio à estabilidade política e social que o Bloco criou no ciclo eleitoral do ano transato desvaneceu-se, substituindo-se na mente dos portugueses pela ideia que os Bloquistas não passam de uma esquerda radical travestida de moderada, obcecados com a laicidade não do Estado, mas da Sociedade no geral. E isso é algo que torna o panorama português mais pobre.