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Sociedade

Sri Lanka: manifestantes invadem as residências dos seus governantes

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Os manifestantes invadiram as residências do presidente Gotabaya Rajapaksa e do primeiro-ministro Ranil Wickremesinghe. Créditos: REUTERS/Dinuka Liyanawatte

Foram vários os protestos que tomaram, recentemente, lugar no Sri Lanka. O povo, descontente com a situação económica do país, reuniu-se na capital comercial Colombo e invadiu tanto a residência do presidente Gotabaya Rajapaksa como a do primeiro-ministro Ranil Wickremesinghe. Nas redes sociais começaram a circular várias imagens dos manifestantes a usufruir das habitações de luxo dos seus governantes. Os invasores recusam-se a abandonar as residências até que ambos se demitam dos seus cargos. Nenhuma destas figuras políticas se encontravam nas residências na altura das invasões.

O primeiro-ministro já anunciou a sua demissão, após ter visto a sua casa ser incendiada. O presidente prometeu demitir-se e assim o fez. Apenas alguns dias após o acontecimento, Gotabaya Rajapaksa foi impedido de fugir para o exílio no estrangeiro. Com receio da reação das pessoas, o presidente procurou carimbar o seu passaporte na zona VIP do aeroporto, mas os funcionários acabaram por impedi-lo. Fontes da Defesa do Sri Lanka apresentavam preocupação face à tentativa de  fuga do presidente , desta vez de  barco, face aos recursos a que tem acesso pelo seu cargo de  comandante-chefe do Estado.

Mas o que é que aconteceu na economia do Sri Lanka? 

O Sri Lanka, antigamente chamado de Ceilão, é uma ilha situada no Oceano Índico. Independente da governação britânica desde 1948, o país foi assolado por uma guerra civil devastadora para as mais diversas áreas da sociedade. A guerra começou em julho de 1983 e opôs o governo central aos Tigres de Libertação do Tamil (LTTE, segundo sigla inglesa). Esta organização política armada lutava pela autodeterminação do povo tâmil através da criação de um novo Estado no nordeste da ilha chamado de “Tamil Eelam“.

A guerra durou quase 26 anos e destruiu centenas de cidades, para além de ter retirado a vida a mais de 100.000 civis e soldados. A LTTE foi considerada uma organização terrorista, devido ao uso de violência indiscriminada. Ambos os lados desrespeitaram  direitos humanos, maltratando prisioneiros, violando mulheres, torturando e assassinando pessoas a sangue frio. Posteriormente, a Amnistia Internacional viria a acusar  a Organização das Nações Unidas por ter “falhado em proteger civis“. Entre 1987 e 2009, os Tigres realizaram mais de 200 atentados suicidas no Sri Lanka e em algumas regiões da Índia, reconhecendo, em maio de 2009 e após muitos avanços e recuos,  a sua derrota,  o que garantiu o término da guerra do Sri Lanka.

Mapa do avanço do governo central do Sri Lanka contra a LTTE. Créditos: Ministério da Defesa do Sri Lanka.

Até à década de 90, o Sri Lanka era um dos maiores exportadores mundiais de chá. O início da guerra levou à falta de cultivo e, consequentemente, à perda do investimento britânico. As consequências reais da crise são, contudo, mais profundas, tendo, em 2019, a escassez de produtos como combustível, medicamentos e alimentos agravado a fome e piorado a situação do país, que sofreu, também, com  uma série de atentados a igrejas e hotéis, acontecimentos que ficaram conhecidos como “Atentados de Páscoa“. O povo manifestou-se nas ruas, porém, o governo permitiu o uso de violência sobre quem se revoltava.

Em 2020, a crise pandémica afetou o setor que mais lucro trazia: o turismo. A economia interna regrediu 3,6% em relação ao ano anterior. Em 2022, o Fundo Monetários Internacional registou uma taxa de inflação na ordem dos 17.6%. O país tem uma dívida estimada em 7 mil milhões de dólares americanos. O país sofre, ainda, com a falta de acesso às moedas estrangeiras em quantidades suficientes para pagar as suas importações.

Taxa de inflação no Sri Lanka ao longo dos anos. Créditos: Fundo Monetário Internacional.

O Sri-Lanka encontra-se numa situação muito debilitada, que se agravou com o início da guerra russo-ucraniana e com o aumento dos preços do petróleo. O governo pediu mesmo à população que trabalhasse a partir de casa, suspendeu aulas e direcionou a venda de combustível a serviços essenciais como hospitais e aeroportos tendo, ainda, declarado oficialmente falência. Estima-se  que a inflação possa atingir os 60% até ao final do ano.  O país  tem recorrido à assistência de países como a Índia e a China e do Banco Mundial. A degradação das condições de vida e o aumento dos preços levou a população a iniciar uma série de  protestos, lutando pelos seus direitos mínimos.

O agora ex-presidente Gotabaya Rajapaksa chegou à Tailândia esta semana, mas não houve pedido de asilo político. Num comunicado à imprensa local tailandesa, o Ministro dos Negócios da Tailândia, Tanee Sangrat, comentou a chegada do ex-presidente dizendo “como portador de passaporte diplomático do Sri Lanka, o ex-Presidente pode entrar na Tailândia sem visto por um período de 90 dias (…). A estadia será temporária para continuar viagem. Não foi pedido asilo político“.

O Sri Lanka tem agora um novo presidente, Ranil Wickeremesinghe, um homem de  73 anos que,  após ter assumido já seis vezes o cargo de primeiro-ministro,  foi,  agora,  eleito chefe de Estado com 134 votos de 225 deputados. O povo, não entanto, revelou-se descontente com esta decisão do parlamento. Poucas horas após a sua subida ao poder, Ranil, que deterá o cargo até 2024, afirmou que se tentarem derrubar o Governo, ocupar o gabinete do Presidente e o do primeiro-ministro, isso não é democracia e responderemos com firmeza.

 

Escrito por Sofia Guimarães

Revisão por Carina Seabra