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Sociedade

Sacheen Littlefeather: a memória de uma ativista pelos direitos civis da comunidade indígena

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Sacheen Littlefeather em 1973 quando recusou o Óscar em nome de Marlon Brandon. Fotografia: AP Photo

Marie Louise Cruz (conhecida como Sacheen) nasceu a 14 de novembro de 1946 em Salinas, na Califórnia. O pai pertencia a  apache e yaqui, duas comunidades indígenas, e a mãe tinha ascendentes europeus. Formou-se em teatro pela California State University e, desde então, começou a procurar mais sobre a sua identidade e raízes indígenas.

Em 1969, participou na ocupação de Alcatraz, uma ocupação pacífica da ilha de Alcatraz, na Baía de São Francisco, Califórnia. O movimento permitiu, em menos de um mês, a união de centenas de nativo-americanos de diferentes comunidades  que protestavam sobre a ocupação americana dos territórios indígenas, estendendo-se por cerca de  19 meses. Sacheen adotou este nome em memória do que viveu durante a ocupação, um acontecimento histórico que viria a ser aprofundado pela  peça do The New York TimesHow a Native American Resistance Held Alcatraz for 18 Months“.

Os nativos jogavam em novembro de 1969. Atrás, a placa foi alterada de “Propriedade dos Estados Unidos da América” para “Propriedade dos Indígenas”. Fotografia: Associated Press.

Carreira e discurso nos Óscares em 1973

No início dos anos 70, começou a participar em anúncios de rádio e televisão com o intuito de se tornar atriz. Juntou-se à Screen Actors Guild, em 1970, e ganhou o prémio de “Miss Vampira EUA” pela sua participação na longa-metragem de terror “Nas Sombras da noite”, de Dan Curtis.

Em algumas entrevistas, Sacheen revelou que conheceu Marlon Brandon, um dos mais aclamados atores norte-americanos pelo seu papel na obra “O Padrinho” (1972), face à luta mútua pelos direitos civis dos nativo-americanos. Sendo o favorito a ganhar o prémio de Melhor Ator dos Óscares em 1973, Marlon Brandon pediu à ativista que fosse ao palco recusar a estatueta em seu nome. O objetivo era criticar publicamente a forma como as comunidades indígenas eram representadas no cinema. Apesar de ter sido limitada a  um discurso de apenas 1 minuto, a atriz foi aplaudida pelo público, ainda que,  posteriormente, tenha sido criticada pelo meio cinematográfico. A ação teve, ainda consequências na sua carreira.

No dia 15 de agosto deste ano, cerca de 49 anos depois do discurso, a Academia dos Óscares pediu desculpa à atriz pelo boicote que a mesma sofreu, convidando-a para uma “noite de conversa, cicatrização e celebração “Este momento resultou no boicote da sua carreira, ataques pessoais, assédio e discriminação durante mais de 50 anos”, descreveu  no convite. Em resposta, a ativista disse à “Hollywood Reporter” que nunca pensou “que viveria para ver o dia em que ouviria isso [pedido de desculpas]“.  No dia 17 de setembro, Sacheen teve a oportunidade de recitar todo o discurso escrito por Marlon Brandon para a cerimónia dos Óscares. O vídeo, publicado pela Academia, pode ser visto na íntegra aqui.

O estado de saúde da atriz deteriorou quando tinha 29 anos e, em 2018, foi diagnosticada com cancro da mama no estágio IV. Num post publicado no seu Facebook, no ano passado, Sacheen Littlefeather anunciou que o seu cancro se alastrara para o pulmão direito, indicando estar em estado terminal. “Eu vejo cada dia como um presente da vida. Olho para o passado com orgulho porque fiz algo que talvez tenha feito a diferença“, escreveu. A atriz faleceu no passado domingo, dia 2 de outubro, em casa. Durante a sua vida, combateu  a discriminação no mundo do cinema. Abandona-nos este mês, deixando   um legado de emancipação e luta pelos direitos civis dos nativo-americanos.

 

Escrito por Sofia Guimarães
Revisão por Carina Seabra