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Ciência e Saúde

“OUVIR O PLANETA” NO NATIONAL GEOGRAPHIC SUMMIT 2019

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Depois de duas edições em Lisboa, o National Geographic Summit escolheu o Porto como palco para mais um encontro de ideias, desta vez centrado na problemática ambiental da poluição por plásticos. Incluído na iniciativa “Planeta ou Plástico?” da National Geographic, o evento, que decorreu no final de abril, trouxe à Invicta cinco oradores internacionalmente reconhecidos para, através dos seus testemunhos, contribuir para a consciencialização da população num momento que é de “ouvir o planeta”.

A sala Suggia, considerada o coração da Casa da Música no Porto, foi o palco eleito para o evento que, segundo a organização, teve lotação esgotada. Assim, terão sido mais de 1200 pessoas as que foram recebidas por João Moleira na sessão de boas-vindas ao Summit. Coube ao jornalista da SIC a apresentação e moderação, tendo acompanhado os participantes ao longo das cerca de 4 horas do evento, introduzindo os oradores convidados e reservando alguns minutos para conversar com eles depois de cada intervenção.

Sessão de boas-vindas

A sessão de boas-vindas contou ainda com abertura oficial do Summit por Deborah Armstrong, a vice-presidente executiva da National Geographic Partners na Europa e África, e por Filipe Araújo, vice-presidente e vereador para a Inovação e Ambiente da Câmara Municipal do Porto (CMP).

Na intervenção de Deborah Armstrong, ficou patente que a organização espera que momentos como este proporcionem a consciencialização da população e que ela adote uma posição ativa na resolução do problema em discussão. Para tal, o objetivo foi conjugar “storytelling” com ciência, para levar todos a participar na missão que é a de ter um “planeta em equilíbrio”.

Por sua vez, Filipe Araújo partilhou o papel que a CMP tem tido no que toca à promoção da sustentabilidade da cidade e algumas iniciativas que têm sido levadas a cabo. Num discurso que focou em três tópicos, Filipe Araújo começou por explicar a importância de perceber o papel decisivo das cidades na procura de soluções ativas para os problemas ambientais. De seguida, afirmou o compromisso da CMP em liderar pelo exemplo e em inspirar e ser um facilitador da mudança de comportamentos junto da população e empresas. Terminou abordando a temática da economia circular e a emergência global que constitui mudar de paradigma.

O poder da fotografia

Terminada a sessão de boas-vindas, o palco recebeu Brian Skerry, um dos mais conceituados fotógrafos subaquáticos do mundo e National Geographic Fellow. Num dos discursos mais apaixonados da tarde, Skerry contou aos participantes do Summit como a criança que cresceu numa pequena cidade de classe operária e um dia sonhava tornar-se fotógrafo da National Geographic, hoje viaja por todo o mundo para documentar a luta pela sobrevivência de vários organismos marinhos e que até já teve a oportunidade de fazer snorkeling com Barack Obama. Confidenciou mais tarde, em conversa com João Moleira, “I never imagined that I would advocate for the ocean, I just wanted to do a cool thing”, mas atualmente o cuidado pelo oceano é uma responsabilidade que sente que precisa de ter.

Assim, com a experiência de uma vida de exploração do oceano, Skerry mostrou como a fotografia pode ser uma ferramenta poderosa para contar uma história, sobretudo de algo que não é tão facilmente compreendido pelo público em geral por estar debaixo de água, nos oceanos. A cada série de fotografias que Skerry partilhou com o público, várias histórias foram sendo contadas, que falaram das duas tartarugas presas em resíduos no oceano que encontrou em apenas três dias, da luta pela sobrevivência da foca-da-Gronelândia, da crise global resultante da pesca excessiva e com práticas insustentáveis e como algumas espécies estão à beira da extinção. Terminou, abordando potenciais soluções, dando exemplos de algumas boas práticas de aquacultura e como o futuro está em passar da “caça para o cultivo” nos oceanos, como se faz em terra, e na necessidade de criar reservas marinhas.

Através do olhar dos animais

Lucy Hawkes, ecologista fisiológica e doutorada na Universidade de Exeter em 2007, seguiu uma abordagem semelhante à de Brian Skerry e focou a sua comunicação em contar algumas histórias, sobre aqueles que diz serem os “animais atletas” e pelos quais declara ser fascinada. Numa intervenção entusiasta que encantou a audiência, Lucy Hawkes mostrou como se pode ver o mundo através dos olhos dos animais com recurso ao trabalho de campo e usando tecnologias que permitem rastrear vários seres vivos.

Lucy Hawkes partilhou algumas das suas descobertas, falando sobre as migrações das tartarugas marinhas, o atum e uma libélula que voa sem parar da India até à costa africana. Falou ainda sobre a migração dos gansos-de-cabeça-listada, que cruzam os Himalaias, tendo já sido avistados a voar no monte Evereste, um dos locais mais remotos e de difícil acesso ao Homem, mas no qual a poluição por plásticos também já é visível.

A ciência do problema

Antes da pausa para o coffee-break, subiu ao palco Paula Sobral, investigadora e professora da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa. Especialista em microplásticos e lixo marinho desde 2008, coordenadora de alguns projetos na área e fundadora da Associação Portuguesa do Lixo Marinho, Paula Sobral levou ao Summit uma palestra mais técnica do que as anteriores, explicando à audiência a ciência por detrás da poluição dos oceanos pelos plásticos.

“Preciso mesmo disto?”

Paula Sobral começou por falar sobre a fonte desta poluição, mostrando os valores mais recentes, em que a comunidade científica estima que 80% do lixo marinho tem origem terrestre. De seguida, apresentou os vários impactes conhecidos da poluição a nível socioeconómico e ecológico na costa e oceano, e o tempo médio que demora a degradação dos poluentes no oceano. Os microplásticos, partículas de plástico de dimensão inferior a 5 mm, foram discutidos com mais detalhe numa segunda parte da apresentação, que terminou com Paula Sobral a desafiar a audiência a responder a perguntas como “Preciso mesmo disto?” e “Preciso mesmo disto em plástico?” quando cada um compra bens.

Economia Circular

Jamie Butterwoth, ex-CEO da Fundação Ellen MacArtur, atual membro do Comité de Investimentos da Circularity Capital, business fellow da Oxford University’s Smith School e especialista em economia circular, foi o quarto orador convidado da tarde. Com uma palestra orientada para as vertentes de gestão, economia e negócios, Jamie Butterwoth explicou o conceito de economia circular e desafiou a audiência a repensar a atual economia.

Ao longo desta palestra foram introduzidos vários princípios ligados à economia circular e apresentados alguns produtos e serviços a ter como exemplo. Jamie Butterwoth guiou ainda a audiência ao longo de uma lista de oito regras a ter em atenção que, a título de exemplo, incluem a que relembra que nem todos os plásticos são iguais e nem todos são maus, como é o caso do material de plástico utilizado ao nível hospitalar. Uma das regras que foi repetidamente defendida é que os resíduos têm de ser vistos como potenciais recursos numa economia circular.

Já após o término da apresentação, João Moleira questionou Butterwoth acerca do que seduz as empresas a implementar este tipo de abordagem aos seus negócios, sendo que, segundo o orador, tal acontece quando as empresas querem definir uma determinada posição na economia, para cumprir a legislação e/ou por pressão por parte dos consumidores.

Desperdício Zero

A última intervenção do Summit coube a Claire Sancelot, ativista do movimento Desperdício Zero (“Zero Waste”) e empreendedora na Malásia, onde abriu a primeira loja de Desperdício Zero do país. Numa intervenção que constituiu uma aula, em estilo descontraído, de como reduzir drasticamente os resíduos que cada um produz no dia-a-dia, a audiência ficou munida de vários truques para alcançar um estilo de vida mais sustentável e fazer parte da solução.

Claire Sancelot partilhou como mudou os comportamentos que tinha em França e em Nova Iorque, quando se mudou para Hong Kong e foi mãe, tendo percebido que doar as roupas velhas e separar os resíduos para estes serem reciclados não era suficiente. Motivada a tornar a sua família sustentável e garantir um estilo de vida saudável para as filhas, converteu-se ao movimento Desperdício Zero. Para tal, defende que reciclar deve ser feito só em último recurso e primeiro é necessário recusar alguns itens do nosso dia-a-dia, reduzir o consumo de bens, reutilizar e fazer compostagem. Foram dados inúmeros exemplos de pequenas alterações que podem ser adotadas na cozinha e na casa-de-banho de cada casa e que reduzem os resíduos produzidos. No final, Claire Sancelot desafiou o público a fazer o “Zero Waste Challenge” durante 3 dias.

Encerramento

O National Geographic Summit 2019 terminou com o regresso dos cinco oradores ao palco e a transmissão um pequeno vídeo que tinham gravado para motivar a audiência a assumir o compromisso pelo planeta.

Da parte da organização, ficou evidente o interesse continuar a realizar este evento, sendo que na intervenção de Deborah Armstrong na sessão de boas-vindas já fora anunciado que duas novas exposições fotográficas vão ser brevemente realizadas no Porto, no seguimento do sucesso da exposição Photo Ark.

 

Artigo por Mariana Miranda. Revisto por Ana Sofia Moreira.