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Crónica

LIBERDADE OU UTOPIA?

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Joana de Sousa

Joana de Sousa

Todo o leigo em qualquer matéria é capaz de formalizar um conceito mais ou menos objetivo daquilo que é o racismo e a xenofobia. Mas, recentemente, encaramos uma outra forma de discriminação social: a homofobia. O direito que cada um de nós tem de ser livre em relação à sua sexualidade. Recentemente, um caso de homofobia foi exposto, quando um cidadão agrediu violentamente uma jovem que beijou uma outra jovem.

A questão que se impõe aqui é: somos livres de andar pela rua, seguros das nossas escolhas e de quem somos? Mas afinal o que é a liberdade, que conceito é este? Para não entrarmos em discussões sobre a matéria, podemos afirmar que a liberdade é um direito nosso, mas esta acaba quando começa a liberdade do outro. Vejamos, eu sou livre de ter as minhas opiniões, de as expressar, mas não posso infringir a liberdade do outro ao querer impor as minhas crenças num outro ser. Tentar impor as nossas crenças, ou tentar mudar a essência de um outro ser, é ultrapassar o limite da nossa liberdade.

Somos livres para nos expressarmos, somos livres para nos vestirmos da forma que mais gostamos, somos livres de pintar o cabelo da cor que queremos, somos livres de defender um clube de futebol, somos livres para amar quem amamos. Ou seremos mesmo?

Em Agosto de 2007, na Inglaterra, uma jovem de dezoito anos, Sophie Lancaster foi brutalmente agredida por dois jovens de quinze e dezasseis anos, que apresentaram como razão para a agressão o fato de a jovem ser identificar como gótica. A jovem viria a ser internada, contudo não resistiu aos severos ferimentos e faleceu treze dias depois.

Se entendemos o conceito de liberdade, somos também capazes de entender um outro conceito, que tal como a liberdade, pertence a todos nós. A igualdade. O conceito de igualdade é simples, e não será necessária uma pesquisa no dicionário, ou na Internet para acompanhar o progresso dos tempos, para delinearmos uma definição de igualdade com alguma precisão. Igualdade significa que eu tenho exatamente os mesmos direitos e deveres do que qualquer outro. Igualdade significa que eu sou tão livre como qualquer outro. Igualdade significa que, como sociedade, a medida de todas as coisas é igual para todos nós. Aquilo que eu tenho, aquilo que eu faço, aquilo que eu escolho, o outro pode fazer o mesmo, exatamente na mesma medida.

Este é o século XXI. Até aqui o homem desafiou e ultrapassou todos os limites da evolução a variados níveis, mas teremos nós, Homens, evoluído enquanto seres que vivem em sociedade? Afinal, assumimo-nos como seres civilizados e entendemos os conceitos de liberdade e igualdade, e todos os dias, os praticamos. Ou será mesmo assim? Será que o Homem evoluiu em vastíssimos campos, mas a nível social ainda julga que uma mulher ruiva é alguém capaz de bruxaria e que merece ser queimada viva em praça pública como era hábito há séculos atrás, onde a palavra civilização não passava de uma utopia? Somos um povo oprimido ou um povo opressor? O povo que oprime quem não lhe é semelhante, quem ama da mesmíssima forma mas o seu amor é por alguém do mesmo sexo. O povo que oprime quem se veste de preto e celebra uma subcultura. O povo que oprime quem é livre de ser quem é.

E hoje, em 2014, quem é esta sociedade? Uma sociedade em que uma pessoa que se identifica como homossexual é brutalmente agredida na rua desumanamente? A homossexualidade não é só um tabú, é também alvo de preconceito, ódio… A homossexualidade continua em 2014 inaceitada por entre várias pessoas, que se acham donos da liberdade de escolha do outro no que toca à sua felicidade, a quem amar. Mas afinal, se um homem e uma mulher apaixonados são considerados amor, porque é que uma mulher e uma outra mulher apaixonadas não são amor? São antes, alvo de ódio. O sentimento, seja ele sentido por um homem em relação a uma mulher ou por uma mulher em relação a outra mulher, continua a ser ele mesmo: o amor. O amor não vê diferenças, não vê ódio. O amor é puro e se assim o é, ninguém tem direito ou autoridade para decidir quem deve amar quem, ou quais os parâmetros da sexualidade de quem quer que seja.

Vivemos numa sociedade em que a civilização é nada mais do que uma utopia. Vemos crianças que por terem excesso de peso sofrem agressões físicas e psicológicas na escola e até mesmo na rua. Vivemos numa sociedade em que, ao sabermos de alguém que toma antidepressivos, de imediato julgamos a pessoa como alguém que deveria estar internado numa instituição psiquiátrica. Nem por um segundo contemplamos a hipótese de levantar o véu e ver o sofrimento que está por detrás. Partimos de imediato para um julgamento que não nos cabe a nós, não cabe a ninguém. Vivemos numa sociedade em que são cometidos homicídios da forma mais desumana, pois não é aceite por alguém que uma pessoa se identifique com uma subcultura e a expresse em si, como parte de si. Mas acima de tudo, vivemos numa sociedade em que a liberdade é também ela uma utopia. Aquilo que somos, quem amamos, como nos vestimos é apenas a nossa liberdade em expressão no nosso ser.

Como sociedade é imperativo a denúncia da intolerância e do preconceito homofóbico e o combate pelos direitos humanos e pela igualdade e é necessário que a nossa voz seja ouvida, que usemos o nosso poder como sociedade unida, para acabar com o preconceito e a intolerância.

Aquilo que somos e quem amamos são as escolhas que a nossa liberdade nos permite fazer. Devemos poder andar na rua e mostrar quem realmente somos. Devemos andar na rua e ao vermos duas mulheres a trocarem um beijo devemos não julgar, não odiar, mas admirar o sentimento que as une. Devemos acabar com os estereótipos em relação à homossexualidade. A homossexualidade trata-se apenas de uma única coisa: amor. E todos nós somos livres de amar.

Mas a liberdade é, hoje em dia, uma utopia, pois, como vemos, a sexualidade de alguém, em 2014, levou a uma agressão, leia-se crime de ódio. Portanto, para que possamos ser livres de andar na rua e beijar quem amamos, seja do mesmo sexo ou não, se queremos vestir-nos da forma que desejamos, se queremos ser quem verdadeiramente somos e poder andar na rua sem medo devemos, em sociedade, acabar com o preconceito, o ódio e fazer da utopia que é a liberdade uma realidade.

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1 Comment

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  1. Oriana Bats

    3 Jul 2015 at 23:21

    Concordo com tudo o que disseste! E quanto aos casos de discriminação por vestir diferente e pertencer a uma subcultura, sei bem como é…nunca sofri agressões físicas, mas sei de quem as sofreu, e vi as marcas. E é horrível.
    E o que mais me preocupa é ver esses casos a aumentarem. Em Inglaterra, após o assassinato da Sophie, têm surgido imensos casos de agressões, inclusive um rapaz teve a sua orelha cortada, tudo porque é gótico.
    Em Portugal não sei se há ou não muitos casos. Apareceu aquele da rapariga no hospital de Cascais que foi maltratada por causa das tatuagens, mas mais de resto não se vê muita coisa por aí. E acho que tem a ver com o facto de as pessoas acharem que as coisas não acontecem. Por exemplo, se eu conto um caso que me aconteça, ou que conheça, não há quem queira saber. Já cheguei a ser seguida por 2 homens durante 10 minutos numa rua (onde passaram várias pessoas), a pregar que eu devia aceitar Deus e deixar as “maneiras do Diabo”, e que só assim seria feliz, etc (e não me largaram mesmo eu dizendo que não estava interessada). Dois homens adultos a seguir uma rapariga (na altura tinha entre 17 a 19) anos, e a gritar essas coisas (not creepy, not creepy at all…), e o melhor: ninguém mexeu uma palha para me defender. Só me largaram quando entrei numa loja (ou restaurante, não lembro). Já tive gente que se agarrou aos seus sacos como se a sua vida dependesse disso, enquanto me deita olhares de nojo, quando eu entro num local (e me sento a 2km dessa pessoa). Já fui chamada de satânica por ter cabelo colorido. E devido a esse cabelo houve uma situação que eu temi bastante, e tive sorte de ter o meu namorado ao pé, pois comecei a ver o caso mal-parado. Estás a ver aquelas pessoas que começam a fazer comentários do género “ai e tal também vou pintar o cabelo assim!/ F***** devias ficar lindo!” etc, e que depois começam a seguir-te e ficam sempre ao pé de ti (e vão-se aproximando e quando te afastas seguem-te e vão ficando mais agressivos. Aqueles não ficaram, mas até tenho medo de pensar o que podia acontecer se estivesse sozinha). Se fosse só uma pessoa ou duas, ainda vá. Eram seis rapazes. Ok as pessoas são cobardes mas nunca se sabe. Enfim já vi e ouvi muita barbaridade. Por isso fico tão irritada quando alguém têm o desplante de me dizer que estas coisas não acontecem.
    É como dizes: a nossa liberdade começa quando termina a dos outros. Ninguém tem o direito de querer enfiar as suas ideias pela garganta dos outros. Como se costuma dizer, não gosta, não olha. Há quem goste. E essas pessoas devem ser respeitadas. Claro que as pessoas podem dizer “ai e tal não estamos tão mal assim, no Iraque houve uma chacina de emos, blah blah wiskas”. Mas não se esqueçam que o Iraque é um país muito governado por costumes religiosos, enquanto nós somos um estado laico *cough* nota-se *cough*. E, claro, ” ai não estamos tão mal como a Rússia que até leis a proibir góticos queria fazer!” (não sei se fez). E quem sabe se não acabamos por chegar aí, com os media super alarmistas em relação aos “comportamentos desviantes dos jovens”, que se não deixam de ser góticos aos 20 anos é sinal que algo está mal com eles, porque isso é suposto ser uma fase, e quem é gótico não é bem sucedido *cough* Adora Bat-Brat *cough*.

    Enfim, podia dizer muito mais, mas acho que já vou daqui pouco num papiro de 2m. Se tiveres algum interesse neste tipo de casos, o meu blog (http://emonika.blogs.sapo.pt/) costuma falar de vários (separadores “notícias” e “aconteceu comigo”, onde relato casos que me chegam as mãos. É algo recente, por isso por agora só tenho lá os meus). O blog http://alterophobia.blogspot.pt/ tem uma listagem que chega até a ser assustadora.

    Peço desculpa pelo testamento mas como não há muita gente que ligue ao que digo, alongo-me sempre um bocado demais, sorry :$

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