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Crónica

OS ALTRUISTICAMENTE EGOÍSTAS

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Sara Monteiro

Sara Monteiro

Os ditados populares fazem parte da génese da língua portuguesa e marcam a nossa identidade cultural. No entanto, com os valores (ou falta deles) da sociedade atual, surgiu um provérbio novo: “Não te podes esquecer, só podes dar para mais tarde receber”.

As pessoas que se guiam por este lema dão-se pelo nome de “altruisticamente egoístas” e adoram fazer tudo pelos outros, contribuir para o bem comum, dar muito, dar sempre, mas com uma condicionante: que daí advenha sempre uma recompensa.

Os altruisticamente egoístas são dados a manifestações públicas, quer sejam de afeto, quer sejam de caridade ou de consciência social. Espalham os seus lemas, as suas mensagens, o seu altruísmo em tudo quanto é espaço público. Das redes sociais às mesas de café, passando pelas filas de espera do supermercado, os altruisticamente egoístas adoram falar dos seus grandes feitos, das suas grandes virtudes, do tanto que tiram de si para dar aos outros.

No entanto, perdem as estribeiras sempre que a sua bondade não recebe resposta na mesma dimensão. Ficam indignadíssimos quando abdicam de uma boa parte do ordenado para comprar um presente para um amigo e no seu aniversário recebem uma prenda de valor inferior. Vão aos arames quando fazem um texto lamechas de 1300 caracteres sem espaços numa rede social e recebem um educado: “Obrigada 🙂 Beijinhos!”. Ficam à beira de um ataque de nervos sempre que contribuem para a divulgação de uma causa social e não recebem um agradecimento público.

Todos conhecem um altruisticamente egoísta e facilmente identificamos quem se enquadra nesta definição. Esta classe dá para receber, elogia para ser elogiada, ajuda para ser ajudada e sempre que não lhe fazem a vontade refila, queixa-se, e lamenta-se de tamanha injustiça no mesmo espaço onde se congratula das suas façanhas solidárias.

Os altruisticamente egoístas são fáceis de colecionar. Não é preciso caderneta e os cromos estão em todo o lado.

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