Crónica
O Vazio Existencial dos Domingos
A semana tem sete dias. O mais lógico seria, creio, dividi-la em dois, como tão bem conhecemos: cinco dias úteis e dois de descanso. Porém, penso que poderá ser sensato ter uma outra perspetiva em relação a esta distribuição. Esta conta com cinco dias úteis, um de descanso e lazer e outro de contemplação e vazio.
Domingos são dias esquisitos. Para muitos é certamente o dia de Deus, de sair de casa cedo, com os mais belos trajes e penteados, a idealizar o que descobrirão sobre os vizinhos mal saiam da eucaristia e do sermão (após aquecerem a voz com cantos celestiais e a mente com reflexões individuais).
Outros consideram, talvez, um sinónimo de família, de ir a casa da avó, ver os primos, revirar os olhos quando o tio ou o pai fazem piadas tão secas quanto o Alentejo em pleno mês de agosto e, acima de tudo, de aproveitar uma saborosa refeição à mesa com quem nos é querido.
Para Mim, Os Domingos São Dias Extraordinariamente Melancólicos
Primeiramente há que reconhecer que os domingos são dias controversos: ora são o primeiro dia da semana, ora são o último. Se aplicarmos este pensamento a qualquer outra situação percebemos o quão bizarro é poder ser, simultaneamente, o primeiro e o último. Ninguém que presencia uma maratona dá o mesmo mérito a quem corta a meta em primeiro lugar e a quem corta em último (apesar da “inspiradora” expressão “os últimos são os primeiros”). Mas os domingos têm essa particularidade.
As tardes desse dia são outra peculiaridade. Não consigo ser produtiva aos domingos depois da hora de almoço, e antes só se acordar de bom humor. No período entre a remoção das sobremesas de cima da mesa e a colocação dos bolos e chás para o lanche só consigo fazer uma coisa bem: deprimir.
O dia ainda não chegou ao fim, mas eu e os meus botões já sentimos ansiedade em relação ao dia que se aproxima. Porque os domingos são os dias em que me apercebo que não aproveitei suficientemente o fim de semana, não descansei bem nem me diverti ao máximo.
Mas esta reflexão, apesar de parecer ser uma que aconteça quando estou em casa entediada, na verdade ocorre em qualquer lado que esteja; posso estar na praia a passear, num parque a ler ou numa padaria a lanchar, o pensamento de desperdício de oportunidades e entretenimento passa-me sempre pela cabeça. Sim, porque qualquer coisa que eu faça ao domingo nunca será inteira e inquestionavelmente divertida por estar sempre acompanhada de uma sensação de ansiedade, como referi.
Porém, ainda não descrevi os domingos com o mais adequado adjetivo possível: preguiçosos.
Domingos
A preguiça ganha outro ar aos domingos. Contagia-se. Propaga-se. E a televisão não ajuda nem um pouco. Ligamos a TV aos domingos, com a esperança de quebrar a monotonia que o próprio dia já assegura, e deparamo-nos com programas pouco enriquecedores, filmes com uma avaliação abaixo das 6.0 estrelas no IMDb e episódios de séries que já passaram mais de duas vezes durante os dias úteis. E refugiamo-nos nos serviços de streaming ou numa soneca (que parece mais vantajosa do que os cenários pintados na frase anterior). Mas o sentimento de não haver nada para fazer mantém-se.
E, num piscar de olhos, já é de noite. Assombra-nos o que passou e também o que virá. Arrependemo-nos da nossa conduta durante o dia, porém não fazemos nada para a alterar agora, porque “já não vale a pena”. E o ciclo repete-se, semanalmente.
Apesar de tudo, e concluindo todo este raciocínio, há uma maneira de ultrapassar o vazio existencial dos domingos. Aceitando-os. Segunda-feira será um novo dia e quer o tema, quer não, ele virá. Pelo menos agora estou viva, saudável e quente no sofá. Às vezes também é preciso parar, sentir tédio e engolir a quietude. Não há que ter medo disso.
Texto da Autoria de Joana Simões