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Sociedade

Arte xávega em vias de extinção

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Na xávega, cientificamente designada por arte de cerco e alar para terra, as redes são lançadas a 4 km da costa, cercando o peixe e arrastando-o em direção ao areal. Antigamente utilizava-se uma junta de bois, mas nos dias de hoje os pescadores contam com a ajuda de tratores.

Segundo as diretivas europeias não é permitido capturar imaturos, que correspondem aos peixes de dimensão inferior a 15 centímetros. É o caso do carapau, a espécie mais comum em Espinho, tipicamente denominada por “jaquinzinho”. Embora os ambientalistas defendam que a xávega pode dizimar a espécie, Leonor Lêdo da Fonseca, vereadora da Ação Social da Câmara Municipal, explica que o que as redes trazem para terra é “ínfimo e residual”.

“Não acredito que a xávega desapareça por rutura do ecossistema, como muitos preconizam. Acredito mais depressa que acabe por falta de apoio, de dinâmica cultural e turística.”

              A ex-representante do município na Comissão Nacional de Defesa da Arte Xávega explica que os grandes arrastões praticados em alto mar causam danos bem mais prejudiciais para o ambiente. Acontece que, ao classificar a arte xávega, a União Europeia aplicou as mesmas restrições estabelecidas para os restantes tipos de pesca, sem atender às suas especificidades. Os pescadores, que no resto do ano desempenham outras profissões, saíram, por isso, prejudicados. Em anos anteriores, a GNR chegou mesmo a confiscar cabazes de peixe e a autuar os homens com coimas de milhares.

Na xávega, embora seja cumprida a malha definida por lei, “tudo o que vem à rede é peixe”, o que significa que inevitavelmente é pescado grande e pequeno. Além de geograficamente delimitada, esta pesca é sazonal, o que significa que é praticada de março a outubro, com pequenos ajustes mediante as alterações climáticas.

O potencial turístico desta arte ainda se encontra em desenvolvimento.  No verão, os forasteiros que visitam a cidade deslocam-se voluntariamente à Praia dos Pescadores. Além de apreciarem o ritual, assistem também ao leilão final, ainda hoje realizado em escudos.  Para Leonor Fonseca, trabalhar numa recriação histórica da arte xávega, como era nos seus tempos ancestrais, é uma das medidas turísticas que pode salvar esta arte.

“Nesta época e não perturbando a atividade económica e profissional das companhas, seria fundamental organizar de forma apelativa um dia por mês, onde os turistas pudessem assistir a uma recriação quase à época, inclusive trazendo uma junta de bois.”

Em colaboração com instituições ambientalistas, fiscalizadoras e a Universidade de Coimbra, a Câmara Municipal elaborou um documento, que propunha que pelo menos o primeiro lance pudesse ser pescado sem restrições. Ainda assim, segundo Leonor Fonseca, “nada mudou”.

Uma vez que as companhas de Espinho não têm capacidade para a atribuição de uma doca, o poder local decidiu construir um posto de vendagem. No entanto, apesar dos pescadores realçarem que as bancas deveriam estar em frente aos armazéns, o poder político optou por posicioná-las do lado contrário do passeio. Para não terem de atravessar a rua com todos os riscos de segurança associados, os pescadores acabaram por nunca as utilizar.

Na atualidade, apenas existe uma pessoa capaz de consertar as redes. Apesar da vontade de passar o testemunho, as gerações mais novas não parecem demonstrar interesse em aprender as técnicas mais antigas. Ainda assim, a comunidade conserva a esperança de manter a arte viva. Rui Neto, membro das Rusgas de S. Pedro, reforça que se encontram “num período de transição, de semear a arte xávega”.

Além de uma atividade identitária e singular no mundo, a xávega urge ser protegida enquanto património imaterial. A imagem dos pescadores e dos barcos de meia-lua disposta pelos postais, cartazes e sacos para o turismo não é suficiente para sustentar a sua prática.

Leonor declara que a arte xávega “é um postal lindíssimo, mas tem de deixar de ser só um postal”. A vereadora afirma ainda que o objetivo passa por “fazer dos jaquinzinhos o nosso galo de Barcelos”.

 

Escrito por Maria José Coelho

Revisão por Beatriz Oliveira

Vídeo por Maria José Coelho