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Crítica

HABEMOS RÚSSIA

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A Casa da Música abriu, finalmente, o seu ano dedicado à manifestação moscovita, o ano orientado para esta música “tão distante e tão próxima da tradição europeia” e de “um ritualismo fundamental” (nas ideias de Rui Pereira, comentador da instituição). Inaugurou-o com dança de origem, com uma das “grandes obras concertantes do século XX” – Concerto para violino nº4 de A. Schnittke – e com uma das composições mais importantes da humanidade – A Sagração da Primavera.

Em relação à última, há que destacar a diferença na receção entre o seu concerto de estreia (Paris, 1913) e qualquer apresentação atual. De um público incompreensível e violento passamos para um que esgota a lotação, confiante. O gap é óbvio e extremamente elucidativo. A dita é um “pedação” de folclore russo, ramificado numa hera de potenciais instrumentais, percussões, madeiras em transmutação, musgo e correias imensas de flores sumarentas, todo um gesto desumano e desmedido de Criação-Destruição. É uma das grandes obras russas e, simultaneamente, a derradeira maneira de estalar esta civilização numa casa de música. Assim foi.

O concerto para violino é uma peça de um carácter cinematográfico. Os seus quatro andamentos remetem para diferentes atmosferas sonoras, bem elaboradas pela orquestra. A solista, Viviane Hagner, teve uma prestação expressiva, demonstrando um domínio apaixonado pelo instrumento tanto nos momentos dissonantes como nos mais suaves (por exemplo, numa alusão à ária barroca, com cravo e violino). Tanto nesta obra como na seguinte, o maestro, Baldur Brönnimann, revelou uma direção relaxada, mas precisa e o público retribuiu com uma ovação de pé.

Apesar do seu título de gigante, o magnum opus de Stravinski não foi encarado a medo pelo conjunto. A primeira parte, Adoração da Terra, foi caracterizada por uma fluência e cores espetaculares. Todos os momentos solistas, por parte do fagote, das cordas, do corne inglês, da flauta alto (na segunda parte) foram deliciosos.

Por outro lado, a segunda parte não portou a explosão diabólica que a imortalizou. Soou pouco cataclísmica. A localização do JUP na sala foi provavelmente infeliz para a perceção desta intensidade e, por essa razão, dá-se o benefício da dúvida. O resto do público não concordou, tendo possivelmente rompido uma das saudações mais emotivas que a Sala Suggia já presenciou.

Estalou-se o verniz desta balalaika. Sejam bem-vindos ao 2016 russo da Casa da Música.

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