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Crítica

Happier than Ever: Billie Eilish enfrentou o Mundo e cresceu

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Em 2021, é praticamente impossível nunca ter ouvido falar de Billie Eilish. Quer seja na boca dos fãs aguerridos que a defendem como “a artista que revolucionou a música pop”, quer seja pelos haters que falam apenas em sobrevalorização e overhype. E é a beber desta tempestade de polarizações e de um processo de reflexão sobre a fama que Billie nos presenteia com Happier Than Ever, o álbum que sucede a When We All Fall Asleep, Where Do We Go?.

Ao segundo longa-duração, Billie Eilish volta a olhar para si mesma, mas de uma perspetiva (naturalmente) distinta da que adotava em When We All Fall Asleep… Se no álbum anterior as letras se debruçavam sobre temas como depressão, a saúde mental e o uso de drogas, o conteúdo lírico de Happier Than Ever assume-se como mais reflexivo.

A Billie que no primeiro disco soava a alguém isolado do mundo em conversas consigo mesmo, ao segundo álbum fala para o mundo com consciência do seu lugar nele.

“Getting Older” abre o lote de canções com o verso “I’m getting older, I think I’m aging well”. De uma forma simples e que vai direta ao assunto, estabelece-se o ambiente para o álbum que se desenrolará daqui em diante. Dois anos depois, a “miúda” de “bad guy” cresceu com confiança suficiente para se lançar à tarefa quase impossível de igualar o sucesso alcançado com o primeiro álbum e anuncia-o sem medo ao primeiro verso do segundo.

Segue-se “I Didn’t Change My Number”, segunda faixa lógica para cimentar a mensagem do álbum com frases deliciosas como “I didn’t change my number / I only changed who I reply to” e “Billie Bossa Nova”, uma das canções mais musicalmente interessantes.

Musicalmente, Happier than Ever apresenta-se como a evolução orgânica e natural de When We All Fall Asleep…, tendo em conta que, sem descartar os graves poderosos e as dinâmicas silêncio/barulho tão característicos do primeiro LP, tudo soa mais complexo e mais expansivo em Happier than Ever. No entanto, se dentro do universo de cada canção está tudo no lugar certo, quando se colocam as canções num conjunto, por vezes o disco perde o foco e é disperso.

Do ponto de vista da produção, Finneas exerce mais uma vez o seu papel de uma forma exímia, mas com menos “obsessão” pela perfeição sonora e embarcando mais em percursos inesperados e inusitados. Exemplos disto são a mencionada anteriormente “Billie Bossa Nova”, a misteriosa “NDA” – que pode bem ser a melhor ponte conceptual entre o primeiro e o segundo disco – e “Oxytocin” pela sua vibrante vertente rítmica.

A meio do álbum, “Not My Responsibility” surge mais como uma mensagem do que uma canção propriamente dita que faz lembrar o interlúdio “Fitter Happier” no álbum lendário OK Computer dos Radiohead. Já na segunda metade, “Your Power” e “NDA” destacam-se como alguns dos momentos mais marcantes do álbum, quer do ponto lírico, quer musicalmente falando.

Ainda que como singles isolados não tivessem soado particularmente interessantes, no contexto do álbum, tal como todas as canções lançadas previamente ao disco, ganham outro poder e outro sentido.

No entanto, é a penúltima canção que é o verdadeiro ponto alto do alinhamento e, provavelmente, da carreira de Billie até agora – “Happier than Ever”. Além da abertura empoderadora com “When I’m away from you / I’m happier than ever”, a canção prima pela honestidade com que retrata o fim de uma relação falhada. Enquanto vai começando lenta e contida, vai crescendo e a serenidade forçada dá lugar à raiva, à desilusão e à libertação. Em vez de cingir à receita de um single de sucesso (e está tudo lá), pode constatar-se a preocupação de fazer a canção soar precisamente ao tema que retrata.

Afinal de contas, Happier than Ever é um álbum rico, por vezes confuso, que ainda que aparente ser menos relacionável do que o primeiro disco de Billie, não afasta qualquer ouvinte. E isto porque não descarta aquela que é uma das maiores forças de Billie e Finneas. Tudo é escrito de uma forma que permite a qualquer um de se colocar no lugar do sujeito da canção. Por mais distante que se esteja, tudo na música de Billie soa “perto”. E ainda que não tenha tentado responder ao hype deixado por When We All Fall Asleep…, o segundo triunfo de Billie Eilish é, ao invés de um mero segundo álbum, um que se ergue por si mesmo e que nos mostra uma artista mais madura, aventureira, inteligente e, sobretudo, honesta.

No último álbum, Billie perguntava-nos para onde íamos quando adormecíamos. Hoje, está bem acordada e não tem a mínima dúvida de onde está: no topo do mundo pop.

Artigo da autoria de Fernando Costa