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Política

PACTO GLOBAL ASSINADO EM MARRAQUEXE QUER IMPULSIONAR MIGRAÇÃO SEGURA

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Após dezoito meses de negociações, foi finalmente assinado, sob os auspícios das Nações Unidas, o Pacto Global para a Migração Segura, Ordenada e Regular. Segundo informações avançadas pelo site de notícias oficial da ONU, 160 países subscreveram formalmente o acordo durante a Conferência Intergovernamental que teve lugar em Marraquexe, Marrocos, em Dezembro último.

O documento consubstancia dois objetivos essenciais: assegurar o respeito pelos direitos humanos a todos aqueles que se encontram em trânsito entre países ou a residir provisoriamente fora do seu país de origem; e introduzir nos procedimentos judiciais e jurídicos internos de cada nação, as condições de regulação que se mostrem eficazes no combate aos diversos fenómenos nocivos que estão associados aos movimentos migratórios: tráfico de seres humanos, exploração laboral, discriminação racial, xenofobia ou exclusão do exercício de direitos políticos, nomeadamente o acesso a serviços públicos essenciais.

Existem cerca de 258 Milhões de migrantes no Mundo

Na Conferência Internacional, que contou com a presença do secretário-geral das Nações Unidas, o português António Gueterres, foi feito um balanço da situação atual das migrações no mundo. Louise Arbour, representante especial do secretário-geral para a Migração Internacional, dirigindo-se aos jornalistas, adiantou que existem cerca de 258 Milhões de migrantes espalhados pelos cinco continentes, dos quais 50 Milhões são crianças. Mais do que um problema regional ou próprio de cada país, a migração, prossegue Arbour, deve ser vista como uma questão global que convém ser tratada cooperativamente entre os estados.

23 medidas vão ser adoptadas pelos 160 estados signatários

Neste sentido, o Pacto, apesar de possuir um estatuto jurídico limitado, já que é não-vinculativo (ao contrário do que sucederia se revestisse, por exemplo, a forma de um Tratado) constitui uma ferramenta importante que permitirá aos signatários dispor de orientações claras para a atuação e cooperação em áreas tão diversas como a segurança, a saúde, a inclusão e o ordenamento jurídico. As 23 medidas previstas correspondem a metas concretas a serem prosseguidas pelos diversos governos nacionais, que incluem: respeito pelos direitos humanos de todos os migrantes; reconhecimento de que os migrantes contribuem para o desenvolvimento económico e social dos países acolhedores; respeito pela igualdade de género em todo o processo de gestão do fenómeno migratório; ou garantia de que o interesse das crianças e dos menores será assegurado em todos os momentos da intervenção.

Alguns países, porém, não assinaram o acordo. É o caso dos Estados Unidos da América e de diversos países europeus em que o tema da migração e dos refugiados tem estado na ordem do dia, muitas vezes pela voz de políticos com um discurso declaradamente anti-migração: Itália, Áustria, Holanda, Polónia, Hungria, República Checa, Bulgária, Letónia, Estónia e Eslováquia. Também Israel, Austrália, Chile e República Dominicana ficaram de fora do pacto ou que não se fizeram representar na conferência. Louise Arbour esclarece que, com o acordo agora alcançado, não se trata de criar «o direito de migrar», como alegaram alguns dos detratores do Pacto, mas de reconhecer, no quadro da lei internacional, que todos os cidadãos têm o direito a ir «a qualquer outro lugar» fora do seu país.

Documento distingue entre migrantes regulares, migrantes irregulares e refugiados

Uma das pedras de toque do documento é a distinção entre migrantes regulares, migrantes irregulares e refugiados. A migração regular, segundo fontes da ONU, “refere-se a pessoas que entram ou permanecem num país no qual não são nacionais por meio de canais legais, e cuja posição naquele país é obviamente conhecida pelo governo e em conformidade com todas as leis e regulamentos.“. A maioria dos migrantes inclui-se neste grupo.

Já os migrantes irregulares são aqueles que entram ilegalmente num país, ou que tendo entrado por vias legais (visa turístico, de estudante ou mesmo de trabalhador) nele permanecem para além do permitido. Nunca é demais sublinhar que a maioria dos migrantes irregulares entra legalmente nos países de destino, só posteriormente transitando para uma situação de irregularidade. Os migrantes que estejam nesta condição poderão ser regularizados, ou, caso isso não possa suceder, ser “devolvidos ao seu país de origem“.

Em situação distinta encontra-se o refugiado. Este é, segundo a definição traçada pela ONU, todo aquele que é “forçado a fugir de seu país por causa de perseguição, guerra ou violência” e que tem “um receio fundamentado de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, opinião política ou filiação em determinado grupo social”. O Pacto cobre apenas a condição de migrante, deixando de fora todos aqueles que se enquadrem no estatuto de refugiado e que são alvo de uma proteção jurídica específica. A sua situação, a nível internacional, é gerida pelas políticas específicas do Alto-Comissariado das Nações Unidos para os Refugiados.

Dinamarca vai criar campo de detenção de migrantes na ilha de Lindholm

A assinatura do acordo surge numa altura em que o tema da migração e das políticas anti-migração marca cada vez mais a agenda política na Europa e nos Estados Unidos. Refira-se, a este propósito, os ecos surgidos recentemente na imprensa internacional que dão conta da aprovação no Parlamento dinamarquês de um projeto-lei que visa transformar a pequena ilha de Lindholm, um território isolado a sudeste de Copenhaga, num campo de detenção temporária de migrantes ex-presidiários. O objetivo é limitar a liberdade de circulação de migrantes a quem foi recusado asilo e que tenham cumprido pena de prisão por crimes de natureza diversa, praticados em solo dinamarquês, mas que, por alguma razão, não possam ser deportados de imediato para o seu país de origem.

Assim, enquanto aguardam a conclusão do processo de deportação, esses migrantes serão mantidos na referida ilha. A polémica gerada pela decisão do parlamento dinamarquês (dominado, nesta altura, pelo partido conservador) foi intensificada pelo facto da ilha ter sido utilizada até à data para acolher laboratórios de investigação científica de vários vírus (o único ferry que faz a ligação do continente à ilha é, aliás, apelidado de ‘Vírus’, pelos locais). Conforme assinala o The Times, a intenção do governo dinamarquês é, muito claramente, enviar aos migrantes a mensagem de que os mesmos não são desejados no país.

N.º de migrantes ilegais caiu para 150 000, em 2018

Outros dados relevantes foram recentemente divulgados pelo Frontex, a polícia europeia de controlo das fronteiras e combate à migração ilegal: o nº de migrantes que entraram irregularmente na Europa caiu, em 2018, para cerca de 150 000, o número mais baixo dos últimos cinco anos e que corresponde a 7% do total verificado em 2015 (ano do pico da crise migratória resultante da Guerra na Síria). Desses 150 000 migrantes ilegais, adianta ainda o Frontex, 57 000 entraram via Espanha, o que significa que a rota ibérica é, neste momento, a preferida dos migrantes que querem chegar à Europa.

Artigo de Miguel Marques Ribeiro. Revisto por Ana Rita Moutinho.